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    Celso Rocha de Barros

    O impeachment

    07/12/2015 02h00

    O PT tomou uma decisão à altura de sua história quando decidiu arriscar perder a Presidência para não absolver Eduardo Cunha. Se a frase anterior tiver algum erro de português, peço desculpas, a última vez que escrevi "O PT tomou uma decisão à altura de sua história" foi antes do novo acordo ortográfico.

    No fundo, se o governo do PT não conseguir reunir 171 votos para derrotar o impeachment, é melhor entregar a Presidência para os donos de sempre. Ninguém aguentaria mais três anos de chantagem.

    Note-se que não é questão de um partido de esquerda que não consegue implementar seu programa porque o parlamento é conservador. Isso seria normal em uma democracia. O que os aliados do PT ao centro e à direita se recusaram a aprovar em 2015 foi o ajuste fiscal. Isto é, do governo foi tirada até mesmo a opção de recuar.

    De qualquer forma, o lado bom é que, em 2016, ou Dilma ou Temer começam um novo governo. Ou Dilma pode enfim tomar posse, ou a turma que obstruiu em 2015 chega ao poder com Temer e é obrigada a dizer para o país: de agora em diante, se quiserem bater panela, batam contra mim.

    Não acho que o impeachment será aprovado. O governo não tem conseguido obter maiorias, mas tem conseguido mais de um terço nas votações. E suspeito que já esteja declinando a disposição geral para uma longa briga política que destrua ainda mais empregos e termine com um governo com forte sabor de "Pague a Série B".

    Atenção para o alarme de viés: eu voto na esquerda, isso pode estar influenciando minha análise. Mas a consultoria Eurasia e a revista britânica "The Economist" também acham que o impeachment não sai, e nunca encontrei nenhuma delas em reunião de DCE (seria uma reunião animada, convenhamos). Talvez, é claro, estejamos todos errados.

    Também não acho que seja certo impedir Dilma Rousseff. O argumento legal apresentado a favor do impedimento é, como disse a "The Economist", uma tecnicalidade. Acho que Dilma cometeu erros, não crimes. Há um mecanismo para corrigir erros na democracia, o voto. A oposição terá nova chance de derrotar Dilma em 2018.

    Também acho que, em caso de impeachment, todas as lições erradas serão aprendidas. O PT, por exemplo, sairá do poder sem reconhecer a necessidade de ajuste fiscal e equilíbrio macroeconômico. Dilma, afinal, não terá caído por ter sido populista: por ter sido populista, se reelegeu. Se cair, terá sido por ter feito o ajuste.

    Da mesma forma, a direita ficará dispensada de explicar como conseguiu perder uma eleição em um ano de crescimento zero, inflação alta e Lava Jato. O impeachment lhe permitiria voltar ao poder sem fazer o trabalho de construção partidária, imposição de sacrifícios às bases e diálogo com os pobres que deram quatro vitórias seguidas ao PT.

    O impeachment não seria a renovação da política brasileira, seria o reforço de nossos velhos padrões: a esquerda economicamente irresponsável, a direita incapaz de se adequar à democracia moderna, e o PMDB com o controle do Orçamento.

    Defendo, enfim, um processo rápido. Quando alguns oposicionistas declaram que pretendem adiar a decisão até a crise econômica piorar, só admitem que seus argumentos não serão aceitos por ninguém que já não esteja nervoso por ter perdido o emprego.

    celso rocha de barros

    É doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, com tese sobre as desigualdades sociais após o colapso de regimes socialistas no Leste Europeu. Escreve às segundas.

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