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    Celso Rocha de Barros

    É um alívio voltar a discutir política em termos de votos, não de manobras

    03/10/2016 02h00

    Ontem os brasileiros novamente foram às urnas para escolher quem os governará por um período de zero a quatro anos, dependendo do que o PMDB decidir no meio do caminho.

    Foi uma eleição de campanhas curtas, comparativamente baratas, e dividindo atenção com impeachment e Olimpíada. Mas é um alívio imenso voltar a discutir política em termos de votos, não de manobras parlamentares ou concursos de fisiologismo.

    Com a campanha curta, as tendências tradicionais de consolidação do eleitorado demoraram a se manifestar.

    Em São Paulo, por exemplo, a divisão entre PT e PSDB acabou só se impondo no final. Até recentemente, Haddad estava empatado com Erundina, e a candidatura mais claramente Temerista do Brasil (Marta/Matarazzo) parecia competitiva até outro dia. No final, boa parte dos votos de Erundina foram transferidos para Haddad, e a máquina tucana foi avassaladora.

    O tamanho da vitória de Alckmin fica mais claro no contraste com o desempenho de sua máquina gêmea, o PMDB do Rio de Janeiro.

    A escolha desastrada de candidato por Eduardo Paes, bem como as denúncias da Lava Jato contra o PMDB fluminense, impediram que na capital fluminense houvesse um movimento semelhante ao que elegeu Dória no primeiro turno. Sem a concorrência da máquina estadual, Crivella conseguiu se segurar no topo, ao contrário de Russomanno.

    A vitória tucana em São Paulo e a derrota Temerista no Rio não chegam a decidir quem levantará a bandeira da centro-direita em 2018, mas é difícil evitar a conclusão de que Temer (e, portanto, Serra) saíram derrotados, enquanto Alckmin é o último tucano em pé no meio do tiroteio.

    Na outra trincheira, a crise do PT abriu espaço para que desafiantes como PSOL ou PDT disputassem a liderança do bloco de esquerda. Às vezes as brigas foram feias, mas, novamente, é um alívio que tenham disputado com o PT no voto, e não do jeito que o PMDB tomou dos tucanos a liderança da centro-direita.

    Não é possível prever o que vai acontecer na esquerda, mas não se deve descartar nem mesmo a possibilidade do PT rachar e de outras legendas surgirem. Linhagens não-petistas da esquerda podem se consolidar onde já existem, como no Rio ou no Amapá.

    As eleições de 2016 foram marcadas por soluções conservadoras para a crise política, seguindo, aliás, o padrão da solução pelo impeachment. Nenhum partido novo se destacou, nenhum nome novo surgiu. Partidos como a Rede, pela esquerda, ou o Partido Novo, pela direita, foram figurantes muito discretos. A novidade seria quem, o neto do ACM?

    A exceção foi a candidatura de Marcelo Freixo no Rio de Janeiro. O PSOL do Rio parece ter chegado em 2016 em um equilíbrio razoável entre ser uma novidade e ter uma estrutura de campanha razoável. É algo que Marina Silva, por exemplo, ainda não conseguiu fazer nas eleições presidenciais.

    Ao lado de inovações tão modestas, tivemos que nos contentar com o estelionato dos políticos que dizem que não são políticos. Você não é político. Quantas vezes grandes coalizões partidárias apoiadas por poderosos interesses econômicos bateram na porta da sua casa lhe oferecendo um lugar na chapa de graça? Você acha que isso aconteceu com algum desses sujeitos eleitos ontem? Olhando daqui, não parece provável.

    celso rocha de barros

    É doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, com tese sobre as desigualdades sociais após o colapso de regimes socialistas no Leste Europeu. Escreve às segundas.

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