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    Celso Rocha de Barros

    Após impeachment, poder não mudou só de mãos, mudou de lado

    15/05/2017 02h00

    Ruy Baron - 05.out.2015/Valor/Folhapress
    GALERIA TRAJETÓRIA MICHEL TEMER - Salão Nobre do Palacio do Planalto Detalhe: Solenidade de Possse dos 8 novos ministros Personagem: Dilma Roussff, presidente, acompanhada pelo seu vice, Michel Temer. durante posse ministerial.?Tags: Presidente, Palacio; Ministros;
    Dilma Rousseff desce rampa no Palácio do Planalto acompanhada de Michel Temer

    Na última sexta-feira (12) o governo de Michel Temer completou um ano. Com três dias de atraso, desejo aqui um feliz "Dia do Cunha" a todos. Na edição de domingo da Folha dei minha opinião sobre as medidas adotadas pelo governo até agora.

    Mas não basta discutir as medidas adotadas por Temer como discutiríamos as de um governo normal. Também precisamos discutir se o governo Temer é um governo normal.

    Imagine o seguinte cenário: após o impeachment de Fernando Collor, Itamar Franco assume a presidência e afasta do governo todos os partidos de direita que apoiavam Collor. Depois de expulsar essa turma toda, Itamar monta um ministério só com PT, PDT e PCdoB, os derrotados na campanha presidencial de 1989, e começa a transição para o socialismo.

    Trocando o sinal e descontando uns 30% de exagero inteiramente justificável, é isso que o Brasil vive desde que Temer assumiu a Presidência. Na última sexta-feira fez um ano desde que a turma que perdeu em 2014 começou seu "Grande Salto para a Frente".

    A principal diferença do impeachment de Dilma para o impeachment de Collor foi essa: o poder não mudou só de mãos, mudou de lado. Quem perdeu a eleição ficou com a Presidência. Isso não é normal. Não é assim que uma democracia bem ordenada funciona.

    Mesmo se nenhuma lei tiver sido violada, nossas instituições claramente pararam de funcionar como deveriam, e o Brasil hoje parece muito mais com uma República de Bananas do que parecia um ano atrás.

    Isso continuará sendo verdade mesmo se a economia melhorar. O Brasil precisa reformar a Previdência, precisa conter gastos e talvez até precise flexibilizar a legislação trabalhista. Mas em uma democracia funcional nada disso seria negociado só entre o centrão e o empresariado.

    O Cunha-Thatcherismo é como uma república de bananas liberaliza sua economia. Em uma república (vá lá, monarquia constitucional) bem ordenada, Thatcher implementou suas medidas depois de vencer uma eleição com um programa liberal.

    Além disso, como previsto por esta coluna, todo mundo tirou a lição errada do impeachment.

    Tendo chegado ao poder sem voto, a direita foi dispensada de descobrir por que em 2018 completará 20 anos desde sua última vitória em eleição presidencial. Sua opção por Doria sugere que ainda acha que o que lhe faltou nas últimas campanhas foi um marketing melhor, não propostas que melhorassem a vida dos eleitores pobres mais do que a vida dos outros.

    E a esquerda, a quem caberia fazer o ajuste se Dilma Rousseff ainda fosse presidente, regrediu ao estágio de dizer que não há deficit na Previdência, que auditoria da dívida é uma boa ideia, esses papos de craque que chuta com as quatro.

    Nos dois casos o problema é o mesmo. Se não é necessário ganhar no voto, ou se Levy não é concessão suficiente, por que fazer concessões?

    E, por último, uma coisa eu garanto: se o governo Temer tivesse resultados para apresentar à população, a semana passada teria sido uma discussão sobre seu primeiro aniversário, não sobre Lula.

    E isso não é só porque a rapaziada chapa branca sempre usa o PT para desviar atenção dos fracassos da direita. É sobretudo porque, se Temer tivesse sido um sucesso, Lula não teria a menor chance de voltar à Presidência da República.

    celso rocha de barros

    É doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, com tese sobre as desigualdades sociais após o colapso de regimes socialistas no Leste Europeu. Escreve às segundas.

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