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    Celso Rocha de Barros

    Vale a pena pensar no custo de parar a Lava Jato na metade

    04/09/2017 02h00

    Pedro Ladeira/Folhapress
    BRASILIA, DF, BRASIL, 16-03-2017, 12h00: O senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no senado, durante entrevista à Folha em seu gabinete. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER) ***ESPECIAL*** ***EXCLUSIVO***
    O senador Romero Jucá (PMDB-RR), que foi gravado falando sobre pacto para barrar a Lava Jato

    Um ano após o impeachment de Dilma Rousseff, a Lava Jato está mais ameaçada do que nunca. O grupo que tomou o poder com Michel Temer é muito mais forte e mais capaz de resistir à operação do que a coalizão liderada pelo PT. O próprio Temer já escapou no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e no Congresso. A força-tarefa da Lava Jato na Polícia Federal foi encerrada. Gilmar Mendes, enfim, é aquilo.

    Antes de nos resignarmos, vale a pena pensar no custo de parar a Lava Jato na metade.

    É difícil medir quanto as revelações da Lava Jato desaceleraram a economia. É muito improvável que o custo tenha sido zero. O capitalismo brasileiro funcionava na base da falcatrua. Quando as falcatruas foram denunciadas, as empresas que eram responsáveis por boa parte do investimento nacional paralisaram.

    As empreiteiras roubavam dinheiro que deveria ter ido para escolas e hospitais, mas também faziam obras. Empresas estatais eram fontes de recursos para campanhas, mas também eram responsáveis por boa parte de nosso investimento. Empresas privadas pagavam para obter vantagens, mas também produziam coisas e ofereciam serviços. Quando o lubrificante da corrupção foi suspenso, essas engrenagens passaram a rodar com mais dificuldade.

    É preciso deixar claro: a Lava Jato não é culpada por nada disso. Os responsáveis por esses problemas são os que fizeram as falcatruas, não os que cumpriram suas funções denunciando-as.

    Mas continua sendo verdade que, em um país em que grande parte do investimento era estatal, e o Estado era capturado por empresas particulares, as investigações de corrupção sempre terão um custo econômico considerável. Não é fácil saber o tamanho desse custo, porque boa parte do debate econômico atual envolve saber se o colapso dos últimos anos é 100% culpa da Dilma ou 100% culpa do Temer.

    E muita gente que sabia dos custos da Lava Jato evitava tocar no assunto porque poderia ser visto como defensor da corrupção. Entendo esse ponto de vista, mas, agora que a operação está ameaçada, discutir seus custos é ainda mais importante.

    Pois é bem provável que os custos da Lava Jato já tenham sido pagos em proporção bastante razoável na crise dos últimos anos. A dúvida é se o povo brasileiro vai receber pelo que pagou.

    E, embora os custos tenham sido altos, a recompensa pode fazer valer a pena. Imaginem se as obras públicas brasileiras –todas elas– ficarem 10% a 15% mais baratas porque não vai mais haver o sobrepreço do suborno. Imaginem se as empresas que prestam serviços ao governo passarem a competir de verdade, sem o direito de formar cartéis. A crise de 2015 e de 2017 se pagaria em alguns anos e, depois disso, o desenvolvimento brasileiro poderia alcançar outro patamar.

    Mas se a Lava Jato for interrompida, teremos perdido alguns pontos de PIB por nada. Não somos ricos o suficiente para desperdiçar pontos de PIB desse jeito, ainda mais em meio a uma crise que também teve outras causas, como a ressaca da Nova Matriz Econômica e a queda dos preços das commodities.

    Se pararmos as investigações antes que o sistema político e o nosso capitalismo tenham sido reformados, estaremos dando um calote gigantesco em um povo pobre que já pagou sua parte em desemprego e miséria. Não parece justo.

    celso rocha de barros

    É doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, com tese sobre as desigualdades sociais após o colapso de regimes socialistas no Leste Europeu. Escreve às segundas.

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