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    Celso Rocha de Barros

    O candidato da situação

    09/10/2017 02h00

    Marlene Bergamo - 23.set.2017/Folhapress
    Prefeito João Doria comparece ao lançamento de livro de Kim Kataguiri, do MBL
    Prefeito João Doria comparece ao lançamento de livro de Kim Kataguiri, do MBL

    Na semana passada a revista "piauí" publicou reportagem em que divulgava conversas do grupo de WhatsApp do Movimento Brasil Livre, aquele pessoal que organizava as passeatas do impeachment e agora reclama de artista pelado para não ter que protestar contra Temer.

    A reportagem não mostra evidências de malfeitos, mas deixou claro o quão envolvido na briga partidária está o movimento (que, até outro dia, jurava que era apartidário). Duas coisas ficaram claras: (1) o MBL é um movimento pró-Doria; e (2) o MBL torce por uma aliança pró-Doria que envolva "PMDB, DEM, evangélicos, agro e MBL", com ou sem os tucanos.

    É algo cômico que o MBL se liste entre forças políticas decisivas como o agronegócio, os evangélicos ou o PMDB, mas, mesmo deixando isso de lado, o que salta aos olhos é que a aliança proposta já existe: é o governo Temer.

    O governo dos sonhos do MBL, portanto, é o governo Temer com Doria na Presidência e a entrega dos cargos hoje nas mãos dos tucanos para o MBL.

    Até aí, nada de novo, disputa de poder normal, é do jogo.

    Mas é notável que o MBL, que pretendia ser uma renovação para a direita brasileira, e João Doria Jr., que até outro dia era apresentado como "o novo", pretendam se apresentar em 2018 como candidatos da situação. Oscilando entre Trump e Macron, Doria deve acabar como Temer.

    Bem entendido, ninguém vai ser maluco de se apresentar em 2018 como o candidato de Temer, cuja popularidade é menor do que a margem de erro das pesquisas. Mas a base governista pode tentar esconder o presidente, ou, até, optar por substituí-lo por Rodrigo Maia no futuro próximo.

    Qual a viabilidade de um candidato de situação em 2018? Não há dúvida de que um nome governista desfrutaria de certas vantagens. A base de Temer é a direita fisiológica brasileira, o grupo mais poderoso da política nacional desde sempre. O governismo terá à sua disposição a máquina federal e a grande maioria das máquinas estaduais e municipais. Contará com um financiamento generoso para a campanha. E, ao menos por enquanto, concorre sozinho pelo apoio do empresariado.

    O candidato governista terá como base de apoio o who's who dos delatados da Lava Jato. Para desviar dessa bala, deve procurar enfatizar a importância da estabilidade para a recuperação da economia, contando que o cansaço com a recessão vai vencer a indignação moral. É exatamente a estratégia que Temer tem usado, e talvez funcione.

    Mas há muito que pode dar errado nisso tudo.

    Um candidato da base de Temer já entraria na campanha sem poder jogar contra Lula a carta do combate à corrupção, e Lula tem muito poucos outros pontos fracos. Se Lula não puder concorrer, mas seus votos continuarem na esquerda, a mesma carta pode ser jogada por Marina ou Ciro contra o candidato de Temer. Finalmente, mesmo se toda a elite da direita fechar com o candidato da situação, uma parte importante dos eleitores conservadores pode optar por Bolsonaro.

    De qualquer jeito, parece claro que a base governista pretende ter candidato em 2018, e, por enquanto, quem saiu na frente para ocupar esse posto foi Doria. Depois de perder quatro eleições seguidas para o PT pela falta de inserção popular, a direita brasileira planeja entrar em 2018 liderada pelo editor da revista "Caviar Lifestyle".

    celso rocha de barros

    É doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, com tese sobre as desigualdades sociais após o colapso de regimes socialistas no Leste Europeu. Escreve às segundas.

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