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    Celso Rocha de Barros

    Os sem-voto e os sem-máquina

    20/11/2017 02h00

    Entre as muitas coisas que farão a eleição de 2018 ser diferente das anteriores está o fato de que, pelo que indicam as pesquisas, quem tem voto não tem máquina, e quem tem máquina não tem voto.

    A coalizão de Temer deve ter candidato. É improvável que essa turma bacana desista fácil de ser governo, no mínimo pelo que isso lhes ajuda a se protegerem da Lava Jato. Uma chapa PMDB/centrão teria o apoio da máquina federal, e isto é uma senhora vantagem: depois de Collor, o único candidato de oposição a vencer a eleição presidencial foi Lula em 2002.

    Entretanto, embora tenha a maior máquina de todas, os governistas, até agora, não têm voto. Nenhum dos candidatos no pelotão de frente das pesquisas apoia o governo. Deve haver um candidato governista em 2018, mas esse candidato ainda não tem nome.

    O PSDB tem, sem dúvida, uma máquina partidária respeitável, e controla a poderosa máquina estadual paulista. No entanto, seu candidato mais forte, Geraldo Alckmin, ainda não decolou nas pesquisas. Não é à toa: a situação do partido é a pior desde sua criação. Aécio Neves está no centro da Lava Jato, e virou símbolo das vitórias do sistema contra a Lava Jato. Mesmo se sair do governo Temer, terá saído tarde, e pode sofrer algum contágio da impopularidade peemedebista.

    Bolsonaro e Marina têm muitos votos, mas não têm máquina. Seus partidos são minúsculos. Não contarão com a estrutura de campanha nacional que os partidos fortes costumam garantir a seus membros. Não terão tempo de TV ou uma fatia generosa do fundo partidário. O mesmo vale para Luciano Huck, caso concorra pelo PPS, e para Ciro Gomes, pelo PDT.

    A exceção parcial a este padrão é Lula, que tem muito, muito voto, e tem o PT. Os petistas estão na oposição, não contam com apoio de máquinas públicas importantes (por isso a exceção é parcial), mas têm estrutura nacional. E contam com o trunfo de serem a oposição mais visível a Temer.

    Entretanto, a expectativa é que Lula seja impedido de concorrer pela Justiça. Parece ser a expectativa da esquerda, inclusive: o PC do B, que sempre apoiou o PT nas eleições presidenciais, lançou pré-candidata própria, Manuela D'Ávila (outra que pode até conquistar votos, mas não terá máquina).

    Enfim, é como dissemos no início: ao menos até agora, há candidatos com máquina, há candidatos com voto, não há candidatos com máquina e voto.

    Não é por acaso: a Lava Jato desmoralizou as máquinas partidárias, e o governo federal atual tem como prioridade escapar da cadeia. É justamente porque as máquinas perderam credibilidade que o apetite por candidaturas "outsider" é maior.

    As redes sociais substituirão os mecanismos tradicionais de propaganda? Políticos locais abandonarão as máquinas partidárias tradicionais e apoiarão novatos com mais votos? A incomparável exposição de mídia de Luciano Huck compensará a falta de estrutura? Os militantes entusiasmados de Marina, Ciro ou Bolsonaro farão diferença?

    Ninguém tem a menor ideia.

    Embora a narrativa do "outsider" contra o sistema seja romântica, o ideal é que nas próximas eleições tenhamos conseguido superar o divórcio entre força institucional e popularidade. O Brasil precisa de partidos fortes. Para se manterem vivas ao longo do tempo, as ideias políticas precisam se institucionalizar.

    celso rocha de barros

    É doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, com tese sobre as desigualdades sociais após o colapso de regimes socialistas no Leste Europeu. Escreve às segundas.

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