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    Celso Rocha de Barros

    A reforma da Previdência era mais urgente do que tirar Temer da cadeia

    27/11/2017 02h00

    No momento, estamos discutindo se o governo Temer conseguirá fazer a única reforma que realmente precisava ter feito: a da Previdência. Passou a trabalhista, que não era urgente e deveria ter sido feita por um governo eleito com a proposta de fazê-la.

    Passou o teto de gastos, cujo grande mérito deveria ter sido forçar a aprovação da Previdência (opa, grande sucesso). Mas o capital político que deveria ter sido gasto aprovando a reforma da Previdência foi gasto salvando Michel Temer da cadeia.

    A reforma da Previdência era mais urgente do que a trabalhista, do que o teto de gastos e do que tirar Temer da cadeia.

    O governo Dilma propôs uma reforma no começo de 2016. O então ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, recentemente voltou ao assunto nesta Folha. Lula apoiou a idade mínima em conversa com blogueiros de esquerda no começo de 2016.

    Todo mundo sabe que tem que reformar a Previdência. Podemos discutir o quanto, em que aspectos, mas o fato permanece: se não fizermos nada, cada vez mais dinheiro que deveria ser gasto com outra coisa será gasto com aposentadorias.

    Não há nada de imoral nisso, a propósito. Se fôssemos um país mais rico e resolvêssemos gastar nosso dinheiro com Previdência, maravilha. Mas ainda não temos saneamento básico, ainda não temos educação fundamental. Devemos ter como prioridade nos aposentarmos cedo?

    Também vale evitar o tom moralista das defesas da reforma. O sujeito que se aposentou cedo dentro das regras não fez nada de ilegal e, se pudéssemos exigir que os cidadãos recebessem do governo menos do que a lei lhes permite, deveríamos, também, esperar que pagassem mais impostos do que a lei lhes exige.

    Não faz muito sentido. A reforma que Temer ainda tenta comprar é bem mais modesta do que a proposta inicial, e isso é bom. Os pontos mais controversos devem ser discutidos com a sociedade na eleição do ano que vem.

    De qualquer modo, ao menos a idade mínima e algumas outras coisas têm chance de passar, e seria bom se passassem.

    Defendo a reforma, enfim, deixando claro que torço para que o governo Temer e a turma do impeachment adotem como hobby o cabeceio de prego.

    Afinal, o PMDB, com o apoio do PSDB e de toda coalizão que está no poder, extinguiu o fator previdenciário para sabotar o ajuste fiscal do governo Dilma, para evitar que uma recuperação econômica ajudasse a petista na guerra do impeachment.

    Poucos meses depois, tendo conquistado o governo, já estavam de volta na TV fazendo cara de bom senso e explicando, com toda condescendência, que o governo é como uma dona de casa.

    E Temer, é claro, foi gravado combinando com Joesley a compra do silêncio de Eduardo Cunha e Lúcio Funaro. E depois disso escapou no STF com a ajuda de Gilmar Mendes, o melhor argumento em favor das aposentadorias precoces e compulsórias jamais produzido. E depois, e depois, e depois.

    Mas, enfim, o interesse nacional ainda deve contar para alguma coisa, não? Seria bom ter mais dinheiro para fazer coisas urgentes, seria bom se as perspectivas de crescimento do Brasil fossem melhores. A reforma ajudaria nisso tudo.

    E facilitaria a vida de quem vencesse em 2018. Da última vez que um governo eleito ficou imobilizado pela crise fiscal, no fim das contas tínhamos Temer.

    celso rocha de barros

    É doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, com tese sobre as desigualdades sociais após o colapso de regimes socialistas no Leste Europeu. Escreve às segundas.

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