Outono de 2013. Numa manhã de sábado, quando a luz parecia concentrar-se no mosteiro de São Bento, respingando poucos raios de luminosidade na rua de mesmo nome, a paulistana Luciana Bortoletto, 35, passou a fitar aquela pequena via com outros olhos: olhos de artista.

Uma das passagens mais antigas de São Paulo, usada como trilha de índios que iam buscar água nos rios Tamanduateí e Anhangabaú, a São Bento e seus arredores assistiram ao crescimento vertical da cidade.

Para a artista, o estreitamento da via acabou refletindo nas relações humanas. "É fácil ver o que acontece dentro das lojas e, de lá, o que ocorre aqui, do lado de fora, o que acaba gerando uma certa cumplicidade entre quem trabalha e quem está somente de passagem", conta Luciana.

	Karime Xavier / Folhapress
	A paulistana Luciana Bortoletto, 35, que faz intervenções artísticas no centro de SP

A São Bento, então, foi escolhida para abrigar um projeto de intervenção que envolve a participação de 15 artistas, entre produtores e dançarinos. Bailarina de formação —e ainda tocadora de sanfona—, Luciana desenvolve o "Entre Espaços - Relações Possíveis no Encontro com a Rua".

Com uma pegada lúdica, quase circense, os artistas criam uma dança pontilhada de pequenas paradas, nas quais eles se misturam a escadas, fachadas, vitrines e calçadas. Nesse balé de rua, a participação é aberta a ambulantes, comerciantes e a quem estiver passando por ali.

O figurino foi criado com base nas cores do calçamento da rua e detalhes de florezinhas —referência às ervas daninhas que insistem em brotar nos lugares mais improváveis, rompendo concreto e asfalto.

Praticante da poesia haicai, de origem japonesa, pautada pela observação da natureza, Luciana conta que sua dança é uma metáfora das raízes expostas das árvores, ao interferir no fluxo e na paisagem urbana.