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    Cláudia Collucci

    Até quanto gastar com o doente?

    20/02/2013 03h00

    Quanto deve ser investido em um paciente com câncer avançado e reincidente? Essa discussão acalorada está em curso no Reino Unido depois que uma comissão do serviço nacional de saúde (Nice) vetou a compra do Avastin (bevacizumab) para mulheres com câncer de ovário avançado atendidas no sistema público de saúde.

    A justificativa é que os potenciais benefícios da droga não compensam seu alto custo. Estão fora da cobertura as mulheres que tiverem reincidência do tumor ovariano até seis meses após o tratamento com a quimioterapia tradicional. A estimativa é que cerca de 5.000 mulheres estejam nessa situação todos os anos.

    A comissão concluiu que, "apesar de o Avastin poder ajudar a retardar a propagação do câncer de uma paciente por um tempo limitado, a evidência não mostrou que a droga justifica o seu custo muito elevado e não poderia ser recomendada".

    O tumor de ovário recorrente afeta entre 55% e 75% das que sofreram de câncer ovariano, e que responderam inicialmente à quimioterapia. O remédio pode dar a essas mulheres até quatro meses de sobrevida.

    Por enquanto, o governo brasileiro tem evitado entrar nessa seara espinhosa do limite radical de tratamentos em razão do alto custo. Prefere, muitas vezes, adiar a incorporação do medicamento à rede pública, como vem acontecendo com a vacina do HPV.

    O sistema público de saúde inglês, no qual o SUS brasileiro foi inspirado, tem comprado essa briga sobre o que vai ou não pagar.

    Ainda que a Constituição brasileira estabeleça a saúde como um direito universal, sabemos muito bem que não temos tudo para todos e que uma hora ou outra o país terá que se debruçar sobre essa questão com mais afinco. O cobertor já é curto e deve encurtar ainda mais com os crescentes custos em saúde.

    Na outra ponta, há uma poderosa indústria de medicamentos e de equipamentos em saúde e seu ostensivo marketing na persuasão de médicos. Muitas vezes douram uma pílula que, a longo prazo, não se mostra tão dourada assim.

    Em meio a isso tudo está o paciente que, diante de uma doença grave, agarra-se a qualquer esperança indicada pelo seu médico e busca na Justiça o direito de acesso a essa droga promissora. Ignora, porém, que, em algumas situações, os novos e caros medicamentos não serão tão benéficos quanto prometem e que seus efeitos colaterais podem ser ainda piores que a própria doença. Fácil, esse assunto não é.

    cláudia collucci

    É repórter especial da Folha, especializada em saúde. Autora de "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de 'Experimentos e Experimentações'.
    Escreve às terças.

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