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    Cláudia Collucci

    O câncer não espera; os bebês também não

    19/08/2014 12h36

    No Dia dos Pais, o bebê Bernardo, filho do candidato do PSDB à Presidência Aécio Neves, recebeu alta após 65 dias internado. Ele e sua irmã gêmea, Júlia, nasceram prematuros no dia 7 de junho.

    Na saída da maternidade, Aécio afirmou que apresentará projeto de lei propondo que o período de quatro meses de licença-maternidade das mães de filhos prematuros comece a contar a partir da alta do bebê. O senador mineiro disse ainda que pretende ampliar os leitos de UTIs neonatal na rede pública.

    Em 2010, a dois meses das últimas eleições presidenciais, o Ministério da Saúde incluiu na lista de medicamentos do SUS o rituximab, uma droga de alto custo que era reivindicada por entidades oncológicas há mais de uma década. Mas apenas doentes de um tipo de linfoma (linfoma grande difuso da célula B) passaram a ter acesso ao remédio. Exatamente o tipo de tumor que tinha acometido a presidente Dilma Rousseff em 2009. Na época, ela foi tratada com rituximab. Apesar de o medicamento prolongar a sobrevida também dos doentes com outros tipos de linfoma, ele só teve sua indicação ampliada no SUS em janeiro último.

    Será preciso eleições todos os anos para que as decisões em saúde ganhem alguma celeridade ou será necessário que os políticos vivam problemas na própria pele para que consigam enxergá-los na pele do outros?

    No caso dos prematuros, Aécio disse aos repórteres: "Eu aprendi muita coisa nesse período aqui [no hospital] e uma delas é que o amor de mãe, o amor dos pais, é essencial para que os filhos se recuperem". "Eu conheci aqui muitas mães que tiveram que largar o emprego porque o tempo de permanência do menino foi muito longo."

    Só a título de informação, senador, já existe um projeto tramitando no Congresso desde 2011 para ampliar a licença-maternidade das mães de prematuros. No entanto, desde março do ano passado ele está parado após ter sido aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

    O projeto prevê exatamente o que o Aécio propõe: que toda mulher possa acrescentar aos dias de licença-maternidade o tempo que faltava para a criança completar 37 semanas de gestação. Hoje, o benefício existe apenas para as servidoras de São Paulo e do Rio de Janeiro.

    A matemática não é simples. Tanto a incorporação de novos medicamentos no SUS quanto eventuais mudanças na lei trabalhista precisam passar por análises econômicas criteriosas. Mas talvez elas pudessem ser mais rápidas e mais transparentes. No caso de drogas como o rituximab, é possível que muitas mortes pudessem ter sido evitadas se ele tivesse sido incorporado há mais tempo (está aprovado pela agência regulatória há 15 anos).

    Já em relação à prematuridade, não há dúvida de que o Brasil precisa atacar o problema em várias frentes. Hoje, a taxa de nascimentos prematuros é de 11,7%, em média. O índice é 60% superior ao da Inglaterra. Ela é principal causa de morte de bebês com até sete dias de vida. Mata cerca de 21 mil crianças todos os anos.

    A maioria dos casos de prematuridade está associada a doenças maternas, como infecções urinárias, hipertensão e diabetes, muitos dos quais poderiam ser facilmente manejáveis com um bom pré-natal.

    Mas isso não elimina a necessidade de se rever a licença-maternidade para mães (ou pais) de bebês prematuros ou de portadores de doenças graves. Vários países da Europa já o fizeram, embora em muitos deles o benefício seja reduzido nesse tempo adicional.

    Por uma razão ou por outra, muitos bebês chegam antes da hora e vão exigir cuidados especiais por parte dos pais. Até porque muitos pediatras não recomendam que eles sejam levados para uma creche antes dos dois anos por conta dos problemas respiratórios. Alguém tem alguma dúvida de que essa mãe precisa de mais tempo?

    cláudia collucci

    É repórter especial da Folha, especializada em saúde. Autora de "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de 'Experimentos e Experimentações'.
    Escreve às terças.

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