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    Cláudia Collucci

    'Cabe a cada mulher decidir pelo congelamento de óvulos'

    23/10/2014 14h40

    O ginecologista Eduardo Motta, professor da Unifesp e um dos diretores da clínica Huntington, pediu espaço para algumas considerações em relação à minha última coluna. Leia a seguir:

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    Na qualidade de médico, colaborador desta coluna e especialista em reprodução assistida, me senti na obrigação de mostrar uma outra forma diferente abordar o tema congelamento de óvulos.

    Sim, é verdade que este não é um procedimento capaz de garantir a preservação da "fertilidade" e, muito menos, o congelamento de óvulos está isento de riscos. Talvez por isso, a comunidade científica tem procurado usar o termo "preservação dos gametas", quer seja óvulos nas mulheres, ou espermatozoides nos homens. E apesar dos homens terem vantagens estratégicas em termos numéricos, o congelamento em si, não garante que um homem terá uma família com absoluta certeza, se congelar seus gametas.

    Mas o fato principal foram as dramáticas mudanças vivenciadas nos últimos 20 anos, onde é absolutamente normal e, talvez até esperado, que uma jovem dedique seus anos dourados reprodutivos, privilegiando não só sua carreira, mas sua ascensão pessoal, cultural e emocional, de modo que as relações conjugais, se iniciam mais tarde.

    Se olharmos para uma estudante de medicina, ela deve começar sua formação ao redor dos 20 anos, considerando os 06 anos de formação e, ao redor de três a quatro para uma especialização, ela terá ao redor de 30 anos. Talvez uma relação estável, neste caso, deva acontecer aos 35 anos. Mas este exemplo, nada mais é do que acontece hoje em uma parcela considerável das mulheres.

    Contudo um fato é inquestionável: ao longo destes anos, o organismo feminino, através de um complexo sistema ainda não bem esclarecido, vai liberar substancias que vão agir nos ovários e estimular o recrutamento dos folículos, pequenas estruturas com um óvulo no seu interior, consumindo a reserva que qualquer mulher possui. Mas este complexo sistema, não se dá de forma homogênea, mas como se trata de uma comunicação química, os melhores folículos, ou aqueles que tem melhor capacidade de responder a estes estímulos, são os inicialmente selecionados, deixando como reserva aqueles que necessitam de maiores quantidades destas substancias e/ou hormônios e, logicamente, mais sujeitos aos erros. Daí a natural dificuldade de se engravidar mais tardiamente.

    Assim a questão principal é esclarecer as mulheres, de forma inequívoca, que todas têm sim um potencial reprodutivo limitado e não basta chegar a uma clinica para realizar um procedimento de fertilização ou congelar seus óvulos, mas o entendimento deste limite biológico é fundamental, e tomar atitudes frente a este dilema, ainda mais importante.

    Por outro lado, de todas as tecnologias existentes em reprodução assistida, sem duvida, a que mais vivenciou avanços nos últimos anos, foi o congelamento de óvulos. Hoje, as taxas de sobrevivência após o descongelamento são superiores a 90%, ou seja, se uma mulher congelar seus óvulos, este material estará intacto na imensa maioria dos casos.

    É evidente que não é uma garantia, mas é uma forma de se beneficiar dos avanços da ciência, respeitando seus limites. Se este congelamento se der antes dos 35 anos, a capacidade de ter gametas (óvulos) capazes de levar a uma gestação é muito boa.

    Em outras palavras, a comunidade científica não quer divulgar o congelamento de óvulos como uma solução mágica para a dinâmica da sociedade atual, mas esclarecer os limites reprodutivos de qualquer ser humano e propor alternativas para aquelas que desejam uma opção, questionável ou não, mas uma opção que até pouco tempo atrás sequer existia.

    Cabe a cada mulher decidir, dentro de suas possibilidades, como seguir adiante, mas o esclarecimento e propor soluções é fundamental. E talvez estas empresas que hoje se preocupam com o bem-estar de suas funcionárias, estejam à frente de seu tempo, entendendo esta nova dinâmica e propondo formas de ajudá-las.

    cláudia collucci

    É repórter especial da Folha, especializada em saúde. Autora de "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de 'Experimentos e Experimentações'.
    Escreve às terças.

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