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    Cláudia Collucci

    Medo leva pais a não vacinar filhas contra o HPV

    07/04/2015 02h00

    Por que a adesão à vacinação contra o vírus do HPV, o papilomavírus humano, está tão baixa? Seis meses depois de o Ministério da Saúde iniciar a segunda fase da campanha, pouco mais da metade (57%) do público-alvo (4,9 milhões de meninas de 11 a 13 anos) foi imunizado. A meta era vacinar 80% dessas garotas.

    A primeira fase da vacinação, que aconteceu em março do ano passado, foi considerada um sucesso pelo Ministério da Saúde: 99% das meninas foram imunizadas.

    O que aconteceu, então, para que a segunda fase ficasse tão abaixo das expectativas? Conversando com amigas que têm filhas adolescentes, lendo blogs e páginas no Facebook uma das explicações parece ser o medo da vacina.

    Ele foi detonado, principalmente, após 11 garotas de uma mesma escola de Bertioga terem apresentado mal-estar após a vacinação em setembro de 2014, na segunda fase da campanha.

    Três acabaram sendo internadas e uma das adolescentes reclamou que não estava "sentindo as pernas".

    Segundo a diretora de imunização da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, Helena Sato, as meninas foram avaliadas, fizeram exames laboratoriais e de imagem e nenhuma ficou com paralisia ou algum tipo de sequela. Todas passam bem.

    Em entrevista ao site do médico Drauzio Varella, Sato diz que o caso pode ter assustado os pais, que, temerosos, optaram por não submeter as filhas à segunda dose da vacina.

    "Consideramos que elas [meninas de Bertioga] tiveram uma reação de ansiedade após a imunização. Algo que ocorre com certa frequência, pois muitas vezes as meninas ficam nervosas e com medo da possível dor que a vacina pode causar."

    Mas não é só isso. A vacinação gerou controvérsias também entre os médicos, especialmente entre os médicos de família que não acreditam a efetividade da imunização.

    Para Gustavo Gusso, professor de clínica médica da USP e diretor científico da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, a vacina ainda não mostrou consistência na proteção contra câncer e muito menos para morte por câncer de colo de útero.

    Em artigo publicado nesta Folha, ele explica que a maioria das lesões intra-epiteliais regride espontaneamente e não se pode afirmar que "se protege contra lesões intermediarias irá proteger contra câncer".

    Ou seja, a vacina não pode ser chamada de "contra câncer" nem "contra o HPV" porque não há demonstração que o vírus ou a maioria dos tipos deixará de circular (como o nome diz ele é "humano" e vive no homem). Sobre a segurança, Gusso diz que os estudos disponíveis atestam a segurança da imunização.

    Isabella Ballalai, presidente da Sbim (Sociedade Brasileira de Imunização), reforça, em nota publicada no site da sociedade, que a vacina distribuída no Brasil e há mais de nove anos utilizada em diversos países do mundo é segura e os efeitos adversos pós-vacinação costumam ser leves e autolimitados.

    Segundo ela, a vacinação, associada às atuais ações para rastreamento do câncer de colo do útero, possibilitará a prevenção da doença nas próximas décadas. Hoje, ela representa a quarta causa de morte por câncer entre mulheres no Brasil.

    A partir deste mês, o próximo alvo de imunização do Ministério da Saúde serão as meninas entre nove e 11 anos. Mas, pelo andar da carruagem, se não aparecer uma boa ação de convencimento, é possível que o estoque de vacinas continue encalhando. Passou da hora de os governos federal, estaduais e municipais darem ouvidos aos medos e preocupações dos pais e às opiniões discordantes na classe médica. A estratégia de ignorá-los dá sinais de esgotamento.

    cláudia collucci

    É repórter especial da Folha, especializada em saúde. Autora de "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de 'Experimentos e Experimentações'.
    Escreve às terças.

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