• Colunistas

    Monday, 06-May-2024 06:20:58 -03
    Cláudia Collucci

    Sem saneamento, combate ao Aedes seguirá ineficaz

    19/08/2016 02h00

    Após o encerramento da Olimpíada neste domingo (21), o país deve voltar novamente os olhos para uma questão sanitária que não deu trégua: a epidemia tríplice de dengue, zika e chikungunya iniciada em 2015 e que ainda persiste.

    Embora os números de dengue e zika tenham sofrido queda no primeiro semestre, os da febre chikungunya seguem crescendo mesmo no inverno. Foram 170 mil contra 17 mil em igual período de 2015. O número de mortes saltou de 6 para 38.

    Até 20% das pessoas infectadas pelo chikungunya continuam com dores articulares e limitações por anos e vão precisar de reumatologistas, de remédios de alto custo e de fisioterapia. Não é preciso ser um expert em gestão em saúde para supor o impacto disso no já combalido SUS.

    Sem contar os casos de transmissão do vírus da mãe para o bebê. Ao menos três Estados (Bahia, Pernambuco e Paraíba) têm registros de recém-nascidos infectados, com quadros de meningite e de hemorragia cerebral que demandam dias de UTI neonatal — estrutura sempre em falta no sistema público de saúde.

    Isso vem a se somar às já conhecidas falhas de assistência aos bebês com microcefalia associada ao vírus da zika. Famílias no Nordeste se queixam da falta de remédios e de vagas nos serviços de reabilitação.

    Bem ou mal, os gestores públicos têm tentado dar respostas a essas questões. Mas um dos pontos centrais na guerra contra o mosquito Aedes aegypti, o saneamento básico, pouco avança na agenda política nacional.

    Só 58% dos domicílios brasileiros têm coleta de esgoto. A maioria dos dejetos (61%) sai dos nossos banheiros e segue para fossas, rios e lagos.

    Mais de 50% dos municípios ainda não resolveram de forma adequada o destino final do lixo. No Congresso já corre novo projeto para adiar para 2024 o prazo de obrigatoriedade para o fim dos "lixões".

    Perto de 85% das casas possuem rede de água, mas não há dados de quantas famílias sofrem com desabastecimento. No último índice nacional de infestação de Aedes, 82,5% dos focos no Nordeste estavam em depósitos de água para consumo. E, no Sul, 49% no lixo urbano.

    As ações contra as arboviroses sempre estiveram focadas no combate ao Aedes, e não nas condições socioambientais. Há muito que o "fumacê" se mostra ineficiente. Em geral, só serve para jogar dinheiro fora e gerar mosquitos mais resistentes.

    Há boas perspectivas em relação aos mosquitos transgênicos, mas, sem um olhar para as cidades, para a falta de saneamento e a urbanização caótica dos grandes centros, o país pouco avançará no combate ao Aedes. Seguirá colecionando epidemias recordes, mortes evitáveis e gerações de pessoas sequeladas.

    cláudia collucci

    É repórter especial da Folha, especializada em saúde. Autora de "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de 'Experimentos e Experimentações'.
    Escreve às terças.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024