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    Cláudia Collucci

    São Paulo não precisa de 'corujão', mas, sim de atenção básica eficiente

    04/10/2016 02h00

    E lá vem mais um novo programa para a saúde de São Paulo. "Corujão da Saúde" é uma das principais propostas do prefeito eleito, João Doria (PSDB), que promete usar a estrutura dos hospitais privados para o atendimento gratuito da população na madrugada.

    Segundo o tucano, o corujão consiste em "alugar" mais de 40 hospitais privados, de várias regiões da cidade, para funcionarem das 20h às 8h, atendendo pacientes da rede municipal.

    A proposta não é exatamente nova. Entre gestores de planos de saúde, essa é uma ideia que já foi defendida em outras ocasiões como forma de utilizar a capacidade ociosa de hospitais privados.

    Acontece que a coisa não é tão simples assim. Aparelhos não funcionam sozinhos. E hora extra de funcionário custa muito caro. Plantões de médicos também. Essa foi uma das razões pelas quais a iniciativa não avançou. A ver quais argumentos e condições Dória utilizará para convencer os empresários do setor.

    Outro entrave na proposta tem a ver com a disponibilidade do morador em se deslocar da periferia para a região central nas madrugadas para fazer exames. Haverá transporte público? E o trabalhador que pega no batente muito cedo, como fica? Perderá dia de trabalho? Conseguirá licença médica?

    Nesse quesito, o atual programa "Hora Certa" faz mais sentido e merecia ser ampliado. Ele permite, por exemplo, que as pessoas sejam atendidas perto de casa e com hora marcada.

    Especialistas do setor argumentam que a principal prioridade da cidade é investir numa atenção básica eficiente, que consegue resolver até 80% dos problemas, sem necessidade de especialistas. Nos últimos anos, cada prefeito quis deixar sua "marca", o que colaborou para deixar o sistema fragmentado e com múltiplos gestores.

    Dória não apresentou até agora metas sanitárias ou assistenciais para enfrentar os motivos pelos quais os paulistanos adoecem e morrem. Na capital, cerca de 22% dos habitantes são hipertensos, 20% são fumantes, 17% têm transtornos mentais comuns, 14% são obesos, 7% têm diabetes.

    Fala também da contratação imediata de 800 médicos, que serão "incentivados" a trabalhar na periferia, mas não diz de onde sairão os recursos e de como convencerá os profissionais a deixar as regiões mais centrais da cidade.

    Enfim, ainda há muito o que se esmiuçar nas propostas do prefeito eleito para que elas avancem além das peças publicitárias da campanha eleitoral.

    cláudia collucci

    É repórter especial da Folha, especializada em saúde. Autora de "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de 'Experimentos e Experimentações'.
    Escreve às terças.

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