• Colunistas

    Wednesday, 08-May-2024 20:54:12 -03
    Cláudia Collucci

    STF julga futuro do amianto, que está na maioria nos telhados do país

    15/08/2017 02h00 - Atualizado às 14h42

    Fred Chalub/Folhapress
    OSASCO, SP, BRASIL, 28-04-2010, 14h00: Ivo dos Santos trabalhou por 34 anos com exposicao direta ao amianto. Hoje ele tem asbestose, uma doenca que dificulta a respiracao e o impede de fazer exercicios. Na foto, ele segura o raio-x do seu pulmao. (Foto: Fred Chalub/Folha Imagem, SUPLEMENTOS/EMPREGOS) ***EXCLUSIVO FOLHA*** 3920
    Homem que trabalhou com exposição direta ao amianto segura radiografia do pulmão

    O amianto já foi proibido por falta de segurança em mais de 60 países, mas, no Brasil, continua presente na maioria dos telhados. O futuro desse material considerado cancerígeno e usado na fabricação de telhas e caixas d'àgua pode ser decidido nesta quinta (17) pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

    O julgamento de uma série de ações relacionadas à proibição do amianto no país foi suspenso na semana passada. Até o momento, o placar tem dois votos a favor do banimento.

    A análise do STF passa pelos danos causados à saúde e ao meio ambiente em decorrência da exploração do amianto e pela validade de leis estaduais que proíbem o uso do material (em contraponto a uma lei federal que permite a utilização do amianto de forma "controlada"). Entre os Estados que vetam o produto estão São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Pernambuco.

    Único a votar na última quinta (10), o ministro Dias Toffoli manifestou-se favoravelmente às leis estaduais: "Hoje, o que se observa é um consenso em torno da natureza cancerígena do mineral e da inviabilidade de seu uso de forma segura, sendo esse o entendimento oficial dos órgãos nacionais e internacionais que detêm autoridade no tema", afirmou.

    A questão central desse debate que se arrasta há 13 anos é se existe a possibilidade ou não do uso controlado dessa fibra mineral. A indústria do amianto defende que sim, que o tipo produzido no Brasil possui alto padrão de segurança.

    O setor também diz que, se a decisão a ser tomada pelo STF for favorável ao banimento, haverá enorme impacto sobre uma atividade que envolve 170 mil empregos, diretos e indiretos, em todo o território nacional.

    Já as organizações de saúde pública, como o Inca (Instituto Nacional de Câncer) e a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), e do trabalho, como a OIT (Organização Internacional do Trabalho) e o Ministério do Trabalho, afirmam que não há possibilidade de uso seguro desse material.

    Na classificação da Iarc (Agência Internacional pela Pesquisa em Câncer) ligada à OMS (Organização Mundial da Saúde), o amianto figura na categoria 1, dos produtos "sabidamente carcinogênicos", ou seja, que favorecem o desenvolvimento do câncer, como cigarro, bebidas alcoólicas e exposição solar por exemplo.

    Segundo a OMS, anualmente há no mundo 107 mil mortes por câncer de pulmão, asbestose e mesotelioma, doenças relacionadas à exposição profissional ao amianto. A organização calcula que cerca de 125 milhões de trabalhadores ainda estejam em contato com o material.

    E a população em geral, que não trabalha diretamente com amianto, corre algum perigo? Segundo os especialistas, há riscos em razão da grande presença desse material nas cidades brasileiras e nas inúmeras possibilidades de aspiração do seu pó.

    "A caixa d'água e o telhado estão quietinhos lá. O risco de liberar fibra é menor. Mas em algum momento a caixa d'água pode ser esfregada, pode haver uma reforma no telhado de amianto, pode ocorrer algum acidente que rompa a telha, como inundação, desabamento, colisão de veículo", disse o médico sanitarista Francisco Pedra, da Fiocruz, em entrevista à BBC Brasil.

    A indústria costuma propagar que as telhas de amianto são usadas no Brasil há quase cem anos e que "ninguém nunca ficou doente por morar em uma casa com telha ou caixa d´água de amianto". Porém, essa garantia não encontra respaldo nas organizações da saúde, do trabalho e da Justiça.

    No Tribunal Superior do Trabalho e em outras instâncias judiciais há centenas de ações que visam a reparação de danos sofridos por profissionais que desenvolveram câncer e outras doenças pulmonares associadas à exposição ao amianto. A jurisprudência tem se consolidado no sentido de responsabilizar o empregador pelos efeitos causados à saúde dos empregados.

    Com tantas evidências favoráveis ao banimento desse material, por que ele continua firme e forte nos nossos telhados e nas nossas caixas'água? Lobbies da indústria do amianto, dizem os pesquisadores.

    O fato é que existem alternativas a esse material, como os silicatos de cálcio, fibras de celulose, cerâmica, carbono, vidro, polipropileno, polietileno, PVA e PP (mistura de fibras sintéticas e celulose), e várias empresas já iniciaram a substituição (espontaneamente ou por decisão judicial).

    A redução em 42% na produção do amianto (306 mil toneladas, em 2011, para 177,6 mil toneladas em 2016) deixa claro que esse é um movimento sem volta. Só falta o STF dar a palavra final.

    cláudia collucci

    É repórter especial da Folha, especializada em saúde. Autora de "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de 'Experimentos e Experimentações'.
    Escreve às terças.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024