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    Claudio Bernardes

    Terrenos contaminados e mercado imobiliário

    18/07/2016 01h00

    Muitas cidades no mundo, inclusive São Paulo, passaram ou estão passando pela transição entre uma economia lastreada na produção industrial por outra alicerçada em um intenso desenvolvimento da atividade de serviços.

    Contudo, esse processo de declínio industrial acaba deixando para trás muitos terrenos, às vezes em grandes áreas, contaminados pelos mais diversos tipos de poluentes, que podem representar sérios riscos à saúde e segurança da população.

    Surgem, então, questões importantes para serem respondidas por técnicos e administradores públicos, tais como: O que fazer com esses terrenos? Na eventual dificuldade de sua reutilização, existiria algum problema em deixá-los da forma como estão?

    Sem dúvida, sob o ponto de vista técnico, esses terrenos devem ser reabilitados para serem adequadamente reutilizados. Porém, com a necessária segurança de que não haverá riscos à saúde ou ao meio ambiente e considerada a forma de utilização pretendida.

    Além disso, a existência de terrenos contaminados sem reutilização traz consigo uma razoável probabilidade de os poluentes ali confinados prejudicarem a saúde humana.

    Isso pode ocorrer pela exposição contínua a produtos químicos voláteis, emanados do solo contaminado, e que carregam toxinas para os espaços no entorno. Essas toxinas podem ser absorvidas por vegetais e seres humanos, causando, ao longo do tempo, efeitos nocivos à saúde.

    Esse cenário não foi somente apontado por especialistas como plausível, mas foi, também, corroborado por pesquisas científicas feitas em locais submetidos a esse tipo de poluição. Estudos confirmaram, por exemplo, a associação entre terrenos contaminados com as altas taxas de nascimento de crianças com baixo peso e com o aumento da mortalidade de recém-nascidos em comunidades residenciais próximas.

    Por essas razões, as autoridades e a comunidade científica em todo o mundo estabeleceram modelos de incentivo e padrões técnicos para a descontaminação e reutilização desses terrenos.

    Um dos mais importantes agentes de transformação presentes nesse processo na maioria das localidades é o mercado imobiliário, que adquire esses terrenos, efetua a descontaminação dentro dos padrões cientificamente determinados como seguros para o tipo de reutilização pretendida e recoloca o terreno para cumprir suas funções dentro do tecido urbano.

    Contudo, principalmente no Estado de São Paulo, o mercado imobiliário pode ser impedido de desempenhar esse importante papel na recuperação urbana em função da atuação de setores do Ministério Público que entendem ser necessária a recuperação integral do terreno e seu restabelecimento à forma original.

    Porém, essa tese é contrária ao posicionamento da comunidade científica internacional, inclusive a brasileira, e torna, na maioria dos casos, economicamente inviável a remediação dos terrenos contaminados, impedindo, assim, seu aproveitamento dentro de padrões técnicos seguros para a saúde da população. Pior do que isso é não tomar nenhuma providência e deixar o terreno contaminado com possibilidades de causar problemas à saúde das pessoas.

    Felizmente, o Judiciário paulista vem tendo a necessária sensibilidade para compreender e conceituar os importantes limites dessa questão.

    Em recente decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar ação promovida pelo Ministério Público no sentido de obrigar o empreendedor a efetuar a inviável recuperação integral, confirmou o entendimento de que o cumprimento dos parâmetros técnicos exigidos pela Secretaria do Meio Ambiente, e previstos em lei, são suficientes para garantir a segurança humana.

    Pelo bem das cidades, e de sua população, esperamos que essa decisão seja mantida pelos tribunais superiores.

    claudio bernardes

    É engenheiro civil e atua como empresário imobiliário há mais de 30 anos. É presidente do Conselho Consultivo do Secovi-SP. Escreve às segundas.

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