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    Clóvis Rossi

    Brasil, Índia e a mudança

    17/04/2014 03h05

    A maior democracia do mundo, a Índia, e uma das maiores, o Brasil, irão às urnas neste ano com alguns importantes aspectos em comum, por mais que sejam distantes e profundamente diferentes.

    Os indianos estão votando há dez dias e são tantos (mais de 814 milhões) que o pleito se estenderá até o dia 12 de maio, em nove etapas sucessivas.

    A principal característica em comum é o desejo de mudança. No Brasil, pesquisas do Datafolha têm mostrado que pelo menos dois terços dos eleitores querem mudanças na maneira como o país está sendo governado, o que, de resto, já ficara claro nas manifestações de junho passado. Na Índia, "a eleição é menos a respeito de políticas e mais sobre o desejo de mudanças", escreve o "New York Times".

    Segunda coincidência: o desejo de mudança parece estar sendo atiçado pelo baixo crescimento econômico.

    No Brasil, a desaceleração observada nos anos Dilma Rousseff é tema permanente de comentários. Na Índia, embora o crescimento atual (cerca de 5%) seja mais que o dobro do brasileiro, é insuficiente para acomodar as formidáveis massas que chegam todos os anos ao mercado de trabalho.

    O incômodo com a situação econômica no Brasil também ficou evidente nas pesquisas da semana passada do Datafolha, nas quais uma firme maioria de consultados teme a alta da inflação e também do desemprego.

    Na Índia, é basicamente a mesma coisa. Também na semana passada, o Pew Research Center, conceituado instituto de pesquisas dos EUA, divulgou pesquisa que mostra que 70% dos pesquisados estavam insatisfeitos com as perspectivas econômicas do país e mais de 80% estavam amargamente pessimistas a respeito dos assuntos econômicos.

    "Tudo é um problema para o eleitor indiano", disse Bruce Stokes, pesquisador do Pew, à revista "The Economist".

    Não soa parecido com os protestos contra tudo de junho no Brasil?

    Outra coincidência: a ascensão de uma nova classe média, com suas reivindicações insatisfeitas. Negreja Chowdhury, colunista do "Times of India", escreve que, se houver uma troca de partidos no governo, "será reflexo de mudanças sociais em curso, com uma crescente, afirmativa e urbana classe média desejosa de engajar-se politicamente".

    A grande diferença entre as duas democracias de massa está exatamente na perspectiva de troca de comando: na Índia, o favorito é a oposição, mais exatamente Narendra Modi, do BJP (Bharatiya Janata Party, Partido do Povo Indiano), conservador e nacionalista. No Brasil, a favorita é Dilma Rousseff.

    O que explica que situações parecidas produzam em tese desenlaces diferentes? Na Índia, a oposição conseguiu oferecer uma perspectiva atraente, na forma de Modi e sua "agressiva ofensiva para desenvolver e industrializar Gujarat [o Estado que governa], o que garantiu ao Estado a reputação de futura China da Índia", escreve Ruchir Sharma, chefe de mercados emergentes da Morgan Stanley.

    No Brasil, a oposição não convenceu o eleitor de que fará melhor.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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