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    Clóvis Rossi

    Nova lua de mel Brasil/EUA

    06/01/2015 02h00

    Antes mesmo do profícuo encontro do dia 1º entre a presidente Dilma Rousseff e o vice-presidente Joe Biden, o secretário norte-americano de Estado, John Kerry, já havia escrito a seu então colega brasileiro, Luiz Alberto Figueiredo, sugerindo que viajasse urgentemente a Washington, para começar a traçar a agenda da visita de Estado de Dilma.

    Como se sabe, a visita deveria ter ocorrido no ano passado, mas foi suspensa por causa do episódio de espionagem sobre Dilma.

    Figueiredo não chegou a responder a Kerry, porque não sabia se ficaria no cargo, mas a sugestão continua valendo para o novo chanceler, Mauro Vieira.

    Aliás, os contornos da viagem já começaram a ser esboçados no encontro Dilma/Biden.

    Dilma deixou claro que não quer uma visita que ela chamou de "black tie", ou seja, cheia de pompa e circunstância. Quer substância, disse a Biden.

    O vice norte-americano pegou o mote e lembrou à sua interlocutora que os EUA têm clareza quanto à agenda que pretendem desenvolver com o Brasil. O que lhes falta é a agenda que Dilma quer levar à frente, para que o relacionamento se situe em um patamar ainda mais elevado, desejo que a presidente expressou a Biden.

    Pode ter sido mera cortesia, mas, se for para valer, é uma definição relevante. Afinal, antes do episódio da espionagem, as relações Brasil/EUA estavam no seu melhor momento desde sempre. Subir um degrau, portanto, não é trivial.

    A conversa entre os dois relacionou temas em que a cooperação deve ser muito mais dinâmica, na opinião da presidente. Dilma citou o comércio, após lembrar que os Estados Unidos perderam para a China o primeiro lugar no intercâmbio comercial com o Brasil.

    A presidente também mencionou a área de Defesa, em que haveria, segundo ela, muita coisa a fazer em conjunto. Aqui, uma especulação minha, que não foi tema da conversa: suponho que, no capítulo Defesa, Dilma queira incluir o combate ao crime organizado, que se nutre essencialmente do narcotráfico.

    Para os EUA, Defesa é lutar principalmente contra o terrorismo; para os países latino-americanos, é combater o narcotráfico. Fecho a especulação e volto à conversa.

    Dilma mostrou interesse também em inovação, citando a enorme capacidade norte-americana nessa área, em especial em ciência e tecnologia. A conversa começou com um elogio de Dilma à "coragem" do presidente Barack Obama de normalizar as relações com Cuba, gesto "histórico" para a presidente.

    O afago foi devolvido por Biden com a informação de que, na véspera do anúncio, tentara ligar para Dilma, para avisá-la, mas não foi possível porque a governante brasileira estava no interior da Argentina para a cúpula do Mercosul.

    Para Dilma, a normalização vai além das relações EUA/Cuba. Provocará, disse ela, uma nova dinâmica nas reuniões multilaterais na América Latina, mais produtiva e construtiva do que as eternas críticas a Washington por sua atitude em relação a Cuba. Está, pois, assentado o tom que marcará 2015 na relação com os EUA.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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