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    Clóvis Rossi

    "Bandiera rossa" toca de novo

    27/01/2015 02h00

    "Bandiera rossa" (Bandeira Vermelha) é uma tradicionalíssima canção dos trabalhadores comunistas e socialistas italianos (ganhou depois versões em muitos idiomas).

    Fazia muito sucesso no pós-guerra e assustava a burguesia, até porque parecia que "avanti popolo", que era a sua abertura, parecia uma marcha irrefreável para o poder.

    Uma fatia da Europa, em especial, acreditava que "bandiera rossa trionferà", como dizia o refrão.

    Não triunfou. Foi para o museu da história quando o comunismo ruiu espetacularmente.

    É pois extremamente sintomático que "Bandiera Rossa" tenha soado de novo dessa vez nas ruas de Atenas, na noite de domingo (25), para comemorar a vitória da Syriza (Coligação de Esquerda Radical).

    Sintomático porque, como escreveu o "Financial Times", "dará à Grécia um dos governos mais esquerdistas em uma democracia europeia desde a Segunda Guerra Mundial" (1939-1945).

    Não é pouca coisa, mas, mesmo assim, não é tudo: é igualmente o primeiro governo antiausteridade eleito na Europa desde a crise 2008/09; e, por fim, é a primeira vez em 40 anos que os dois partidos tradicionais (os conservadores da Nova Democracia e os socialistas do Pasok) ficam fora do governo.

    Há quem ache que é hora de tirar do baú a partitura de "Bandiera Rossa". Caso, por exemplo, de Nichi Vendola, líder do SEL (sigla em italiano para Esquerda, Ecologia e Liberdade), que pede "o nascimento de uma coordenação de forças políticas e de associações da esquerda da esquerda".

    Ou de Benoît Hamon, da esquerda do Partido Socialista francês e ex-ministro da Educação, para quem "seremos obrigados a recolocar as questões que não digam respeito apenas ao equilíbrio orçamentário mas também às condições de vida do povo".

    Hamon vê um quarto ineditismo na vitória da Syriza: "Vai aportar pluralidade ao debate político europeu, que não passava até agora de um debate sobre nuances".

    Mesmo entre os que devem odiar "Bandiera Rossa", há o reconhecimento de um "turning point" na política europeia. Caso do guru dos investidores Mohamed El-Erian, que escreve para Bloomberg:

    "O desenlace das eleições gregas é indicativo de um fenômeno político mais amplo na Europa, que envolve o crescimento de partidos não tradicionais. Propulsado por preocupações sobre decepcionante crescimento, pelo desemprego e temas sociais, é reforçado pela disseminada insatisfação com a ordem política estabelecida".

    Mas, atenção, exceto no caso da Grécia, não é a esquerda a beneficiária dessa insatisfação. Ou, pelo menos, não é a única beneficiária.

    É verdade que, na Espanha, ela canaliza intenções de voto em um conglomerado ("Podemos") de fato aparentado com Syriza.

    Mas é só: na Alemanha, França e Reino Unido, o mal-estar se traduz em apoios a partidos de extrema direita, como a Frente Nacional francesa, a Alternativa para a Alemanha ou o UKIP (Partido pela Independência do Reino Unido). "Bandiera Rossa" não é, pois, o único potencial hit-parade na praça.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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