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    Clóvis Rossi

    O poder é coisa de macho?

    23/04/2015 02h00

    Hillary Clinton, favorita por ora para suceder Barack Obama, acha que a igualdade de direitos das mulheres é a tarefa pendente do século 21. De fato é, embora haja outras não menos relevantes.

    Hillary tem razão também quando diz que "as mulheres são a fonte de talento menos aproveitada do mundo".

    Na minha filosofia de botequim, sempre achei que, se os homens, que dominam o mundo desde sempre, construímos essa baita confusão que se vê todos os dias no noticiário, as mulheres só poderiam fazer melhor.

    O problema é que as mulheres no poder não têm conseguido executar uma política que se possa chamar de feminina, seja lá o que isso signifique, mas que, certamente, seria diferente da masculina.

    Nem a própria Hillary consegue. Maureen Dowd, uma das mais brilhantes (e cáusticas) colunistas do planeta, escreve, no jornal "The New York Times", que a pré-candidata democrata "não consegue imaginar como fazer campanha como mulher".

    Dowd critica o fato de que, nas primárias de 2008, em que perdeu para Obama a indicação pelo Partido Democrata, Hillary seguiu os conselhos de dois homens (seu marido, Bill, e o estrategista Mark Penn) e "fez campanha como homem".

    Perdeu por isso toda a feminilidade e o coração, até porque Penn esgrimia a tese de que "a maioria dos votantes na essência vê os presidentes como os 'pais' da nação (...) e não quer alguém que seria a primeira mamãe".

    Por isso, sempre segundo Dowd, o estrategista de 2008 modelou Hillary como a "Dama de Ferro" Margaret Thatcher.

    Aqui chegamos a um problema para a minha tese e para os desejos de Hillary e Dowd: mesmo dotada de músculos de macho, Thatcher foi bem sucedida como governante.

    Não que eu goste de suas políticas, ao contrário. Mas os eleitores britânicos, que são os que têm que gostar ou não, gostaram tanto que a reelegeram sucessivamente. E ela deixou um legado imitado em diversas latitudes, goste-se ou não dele.

    Outras governantes, pelo menos na América Latina, têm tido menos sucesso, modeladas ou não como "damas de ferro".

    Dilma Rousseff, por exemplo, é sempre descrita como dura, o que não a impede de viver um tremendo inferno astral.

    A chilena Michelle Bachelet, mais "mãezona", também vê sua popularidade rolar ladeira abaixo.

    Cristina Kirchner, outra cuja característica marcante é uma belicosidade extrema, alterna bons e maus momentos, sem que se possa dizer que mudou para melhor a tortuosa política argentina.

    Tudo somado, nenhuma das três executou políticas essencialmente diferentes das que foram praticadas por seus antecessores homens.

    Aliás, o que seriam políticas com marca e cara de mulher? Quais seriam os talentos que Hillary Clinton acredita não aproveitados e que os homens não temos?

    Ou será que Penn tem razão ao dizer que os eleitores querem mesmo um "paizão", não uma "primeira mamãe"?

    Talvez por isso, os americanos jamais elegeram uma mulher para a Presidência. Espero que Hillary mostre que ele está errado.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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