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    Clóvis Rossi

    A destruição da Venezuela

    14/06/2015 04h00

    De Felipe González, ex-presidente do governo espanhol, de volta à Espanha depois de uma passagem de dois dias pela Venezuela: "A Ve­ne­zue­la é um país em pro­ces­so de destruição".

    Exagero de um dos incontáveis conspiradores que o governo do país descobre cada vez que é criticado?

    Pode ser, mas é mais provavelmente a constatação de uma realidade que nem mesmo chavistas de carteirinha conseguem negar.

    Exemplo: Jorge Giordani, ministro durante longo tempo com Hugo Chávez e um dos primeiros vice-presidentes de Nicolás Maduro.

    Ele acaba de apontar para o portal Aporrea, de defesa do regime chavista, "a grave distorção que sofre a economia venezuelana".

    Trata-se de "uma bomba-relógio", que tem muitas causas, entre elas "a falta de liderança".

    Para Giordani, o país não tem rumo, particularmente na economia. "Estamos assim: conforme as coisas vêm, vamos vendo."

    Todo o mundo sabe como "as coisas vêm" nos últimos anos: inflação recorde, desabastecimento idem, para não falar na insegurança coletiva em um país com o segundo maior número de homicídios por 100 mil habitantes, atrás de Honduras.

    No plano institucional, a destruição da Venezuela é vista assim por duas analistas do Centro para a Aplicação de Ações e Estratégias Não Violentas: "Durante o governo de Hugo Chávez, suas políticas se arrastavam nos limites da ditadura. Hoje, dois anos após a morte de Chávez, seu sucessor cruzou o limite do autoritarismo para a ditadura", escrevem Srdja Popovic e Victoria Porell.

    Já no plano social, o descontrole absurdo da economia no período Maduro (embora as sementes tenham sido plantadas por seu antecessor) leva a ameaçar fortemente os inequívocos avanços sociais da era Hugo Chávez (1999-2013).

    É o que mostra claramente relatório do Provea (Programa Venezuelano de Educação e Ação em Direitos Humanos), ONG a que Maduro recorreu quando era líder sindical.

    O presidente "está causando o maior retrocesso em direitos sociais das últimas décadas", diz a "El Nacional" Rafael Uzcátegui, o coordenador-geral da instituição.

    Mais: "Se a tendência se mantiver, no fim de 2015 teremos na Venezuela a mesma quantidade de pobres que existia em 2000, quando se contabilizavam 10.954.595 pessoas em tal situação".

    Como a população total da Venezuela é de 31,5 milhões, tem-se, portanto, que mais de um terço é pobre.

    Suspeito que a desconfiança em relação à liderança de Maduro tenha contagiado até os mais altos escalões bolivarianos.

    Não seria essa a explicação para a recém-encerrada missão de Diosdado Cabello ao Brasil, para explorar acordos?

    É uma iniciativa muito mais adequada ao Executivo de Maduro do que ao Legislativo que lidera Cabello.

    Como, segundo o ex-ministro do Planejamento Giordani, a economia é tocada na base da improvisação, talvez Cabello tenha resolvido agir.

    Mesmo que seja assim, são projetos de maturação demorada, pelo que a destruição da Venezuela não está em via de interrupção.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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