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    Clóvis Rossi

    Primária mantém Cristina viva

    03/08/2015 02h00

    Shannon O'Neil, pesquisadora de América Latina para o Council on Foreign Relations, recorre a uma regra de ouro da política argentina para prever o resultado das primárias obrigatórias que se realizam no domingo, 9:

    "É difícil, se não impossível, derrotar os peronistas quando estão unidos".

    (De fato, nos 32 anos desde a redemocratização do país, o peronismo só não governou durante oito deles e, assim mesmo, os presidentes não peronistas tiveram que renunciar antes do tempo.)

    A questão seguinte óbvia é saber se os peronistas estão suficientemente unidos para que se preveja desde já a vitória de Daniel Scioli, o candidato peronista às primárias e concorrente único do bloco governista, o que lhe assegura a passagem para a eleição de verdade em outubro.

    Shannon aponta que o fato de a presidente Cristina Kirchner ter imposto seu fidelíssimo aliado Carlos Zannini como vice de Scioli significa a busca de unidade entre o peronismo tradicional de Scioli e o peronismo kirchnerista da própria Cristina.

    Mas Maria Victoria Murillo, professora de ciência política e assuntos internacionais da Columbia University, lembra que Scioli "necessita dos votos do candidato centrista Sergio Massa, que também é peronista, para derrotar o candidato da direita, Mauricio Macri [governador da Cidade Autônoma de Buenos Aires, a capital]".

    Há um terceiro peronista, José Manuel de la Sota, disputando as primárias.

    Ainda assim, todas as pesquisas apontam para uma vitória de Scioli nas primárias, que funcionam como uma espécie de superpesquisa de intenção de voto para o pleito de outubro.

    Desde já, no entanto, fica claro que Cristina Kirchner não é carta fora do baralho, ao contrário do que se chegou a supor quando não conseguiu a maioria que necessitava, nas parlamentares de 2013, para mudar a Constituição e, assim, tentar ela própria um terceiro mandato.

    Maria Victoria Murillo explica a sobrevida da presidente: "A maioria da população está otimista sobre o futuro da economia, independentemente dos indicadores econômicos [inflação alta, crescimento baixo e dólar paralelo muito descolado do oficial].

    Cerca de um terço dos eleitores acham que a economia vai melhorar e outro terço, aproximadamente, que vai permanecer na mesma, o que, para o padrão argentino de sempre esperar uma crise, não é mau".

    Se a análise se revelar correta, ainda ficará a questão de que a presidente deixará o poder e, portanto, não se sabe o que acontecerá com a sua influência em um governo Scioli, mesmo tendo indicado ela própria o vice.

    Diz Shannon O'Neil: "Ela espera manter influência e poder, algo que seus predecessores também quiseram, mas fracassaram em fazê-lo. E a Vice-Presidência, embora simbólica, não é institucionalmente poderosa".

    Em todo o caso, conclui Shannon, Scioli "pode achar útil mantê-la próxima, para mobilizar apoios para mudanças que ele queira fazer".

    Meu palpite: líderes peronistas detestam sombras sobre seu poder. Logo, é improvável que Scioli queira uma tão poderosa por trás.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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