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    Clóvis Rossi

    Janot, os esqueletos e o prêmio

    01/12/2015 15h36

    É um perfeito retrato do momento brasileiro o fato de que o procurador-geral, Rodrigo Janot, tenha sido o único brasileiro escolhido para figurar entre os cem "Global Thinkers", a lista anual da revista "Foreign Policy", que acaba de ser divulgada.

    Janot foi escolhido por "mostrar os esqueletos no armário do Brasil", óbvia alusão ao escândalo do petrolão, que parece interminável.

    Quer dizer que 2015 foi, do ponto de vista internacional, o ano em que a corrupção tomou conta do noticiário sobre o Brasil. É a má notícia, embora não seja nova.

    Evaristo Sá - 17.set.2015/AFP
    O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao iniciar seu segundo mandato
    O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao iniciar seu segundo mandato

    Corrupção no Brasil é coisa tão antiga que remonta ao Descobrimento: na carta em que comunica o descobrimento ao rei de Portugal, Pero Vaz de Caminha caititua uma boquinha para um parente.

    A "Foreign Policy" explica assim a designação de Janot, enquadrado no subitem "Challengers", ou "desafiadores", no conjunto dos "Global Thinkers":

    "Petrobras, a gigantesca estatal do petróleo, era a pedra angular da economia do Brasil. Sua liderança representava um quem é quem dos mais poderosos do país, incluindo a presidente Dilma Rousseff" (não, hidrófobos de plantão, a revista não está dizendo que a presidente está envolvida no escândalo da Lava Jato; apenas é uma lembrança do fato de que ela foi presidente do Conselho de Administração da companhia).

    Depois, a "FP" lembra que a todo-poderosa companhia foi envolvida em um escândalo que ela cifra em US$ 3 bilhões em propinas, justamente como resultado da investigação liderada por Janot.

    A justificativa para pôr o procurador na lista diz que ele, "sem temer, foi atrás do círculo íntimo da presidente". E cita todas as denúncias, no total 117, feitas no caso, o que "custou à Petrobras a [queda da] presidente e mais cinco altos executivos".

    Ruy Baron - 26.mar.2015/"Valor Econômico"
    Maria das Graças Foster, ex-presidente da Petrobras, na CPI da Câmara sobre a empresa
    Maria das Graças Foster, ex-presidente da Petrobras, na CPI da Câmara sobre a empresa

    Consequência no mercado: o valor da Petrobras medido em Bolsa saiu de US$ 310 bilhões em 2009 para cerca de US$ 30 bilhões agora.

    É triste, é revoltante, é tudo o que você quiser, mas é possível encontrar um segundo ângulo –este positivo– do momento brasileiro: as instituições estão funcionando talvez como nunca antes neste país.

    A "Foreign Policy" lembra que o cargo de procurador-geral é independente do Executivo, mas nem sempre seus ocupantes tiveram o destemor que Janot demonstra em usar a independência quando ela machuca o governo de turno.

    É sempre útil lembrar que um dos antecessores de Janot, Geraldo Brindeiro, era chamado de "engavetador-geral" da República.

    Vale lembrar também que o novo papel do Ministério Público em geral é filho da Constituição de 1988, aquela que Ulysses Guimarães chamava de "Constituição Cidadã".

    A escolha de Janot como um dos "global thinkers" mostra que, de fato, a cidadania está bem representada e que, apesar das trevas que circundam a pátria nos dias que correm, o Brasil pode sair da Lava Jato melhor do que nela entrou.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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