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    Clóvis Rossi

    As feras esperam Nelson Barbosa

    18/01/2016 02h00

    A presidente Dilma Rousseff jogou às feras o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa: desistiu de vir ela própria ao tradicional Fórum de Davos, presença a que se comprometera no ano anterior com Klaus Schwab, o professor e empresário suíço que criou o Fórum Econômico Mundial.

    Em seu lugar viria praticamente uma equipe econômica inteira: além de Barbosa, chegaram a ser anunciados Armando Monteiro Filho (Desenvolvimento, Indústria e Comércio), Katia Abreu (Agricultura), Eduardo Braga (Minas e Energia), para não mencionar Luciano Coutinho (BNDES).

    Na lista definitiva, ficaram só Barbosa e Coutinho.

    O ministro da Fazenda vai enfrentar uma audiência hostil: há um tremendo descrédito do governo brasileiro entre os empresários, que são a grande clientela do Fórum (1.500 estão inscritos), especialmente entre os brasileiros.

    Lembra-me um pouco a presença em Davos, em 1992, de Marcílio Marques Moreira, o então ministro da Economia do governo Fernando Collor.

    Ele havia assumido fazia pouco, em lugar da tresloucada Zélia Cardoso de Mello, cujo programa econômico já fracassara.

    O ministro brasileiro participou de um almoço com empresários brasileiros e estrangeiros, fez um discurso otimista e garantiu que, em dezembro, a inflação estaria em 2% ao mês.

    Perguntei a dois empresários (um norte-americano e outro suíço) se acreditavam. Disseram que não. Acertaram. A inflação de dezembro de 92 bateu em 23,7%, Marcílio já não era mais ministro nem Fernando Collor o presidente.

    Agora, Nelson Barbosa apresenta-se ao povo de Davos quando o Brasil tem "um dos piores desempenhos econômicos no mundo hoje", segundo a coluna de Henrique Meirelles na Folha deste domingo, 17.

    Natural, portanto, a desconfiança, ainda mais que Barbosa é identificado com a chamada Nova Matriz Econômica, a política seguida por Dilma, e que "gerou o problema atual", sempre segundo Meirelles ("habitué" de Davos antes e durante seu período no governo. Fala a língua desse povo).

    Barbosa não será vaiado. Afinal, o público de Davos é educado e o Fórum, ao contrário do que supõe certa esquerda canhestra, não é o local onde os capitalistas conspiram contra os povos do mundo.

    Se há conspiração, ela se dá nos "boards" das grandes corporações, longe dos olhos do público.

    Davos é um formidável ponto de discussões sobre os mais diferentes assuntos e a maior concentração de personalidades em um mesmo local que o mundo produz anualmente.

    Mesmo que seja vaiado, eu, se fosse Barbosa, não me preocuparia. Davos está longe de ser premonitória.

    Exemplo: Guido Mantega, o principal responsável pela Nova Matriz Econômica, frequentou muito o Fórum e nunca foi questionado sobre suas políticas.

    Outro exemplo: Carlos Saúl Menem, enquanto presidente argentino, era recebido no Fórum com tapete vermelho (e gordas comitivas). Não obstante, arruinou a Argentina.

    Tudo somado, tem-se que o povo de Davos pode estar uma fera com o Brasil de Dilma, mas feras raramente são sábias.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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