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    Clóvis Rossi

    Neoliberalismo em xeque

    02/06/2016 02h00

    Acaba de sair uma crítica ao neoliberalismo, modelo hegemônico no planeta e em vias de ser reimplantado no Brasil. A crítica não veio da esquerda, mas do Fundo Monetário Internacional —o guardião mais ou menos inflexível da ortodoxia.

    O texto é assinado por três pesquisadores do Fundo, Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani e Davide Furceri, que não devem ser confundidos com os funcionários da instituição que andam pelo mundo impondo o cumprimento das rígidas regras que o trio agora critica.

    O documento tem a grande vantagem de definir o que considera neoliberalismo, um termo que virou anátema porque seus críticos (em geral à esquerda) tratam-no como algo pior que o vírus da zika, mas seus defensores evitam definir-se como neoliberais, sei lá por quê.

    Eis a definição: "A agenda neoliberal —rótulo usado mais por críticos do que pelos arquitetos de tais políticas— assenta-se em duas bases. A primeira é mais concorrência —conseguida pela desregulamentação e a abertura dos mercados domésticos, incluindo os mercados financeiros, à concorrência externa.

    A segunda é um papel menor para o Estado, obtido por meio de privatizações e limites na capacidade dos governos de incorrer em déficits fiscais e em acumular dívida."

    Aditya Chakrabortty, comentarista econômico sênior do "Guardian", saudou o artigo como o prenúncio da morte do neoliberalismo.

    Exagero. Os pesquisadores do FMI até ressaltam qualidades em seu objeto de pesquisa: "A expansão do comércio global tirou milhões da pobreza abjeta. Investimento estrangeiro direto foi, frequentemente, uma maneira de transferir tecnologia e know-how para economias em desenvolvimento. A privatização de empresas estatais levou, em muitos casos, a uma provisão mais eficiente de serviços e reduziu a carga fiscal dos governos".

    A crítica se centra em aspecto que interessa diretamente ao Brasil do presente: "Em vez de entregar crescimento, algumas políticas neoliberais aumentaram a desigualdade, ao mesmo tempo em que prejudicavam uma expansão duradoura".

    Acrescenta Chakrabortty, do "Guardian": "[A agenda neolibeal] causa 'crashes' épicos que deixam para trás destroços humanos e custam bilhões para limpar".

    É uma óbvia alusão à crise de 2008/09, atribuída em grande medida à desregulamentação excessiva, pilar do neoliberalismo. O baixo crescimento é, aliás, tema principal do Panorama Econômico Global, divulgado nesta quarta-feira (1º) por um dos templos neoliberais, a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico):

    "A economia global está presa em uma armadilha de baixo crescimento que requer o uso mais coordenado e abrangente de políticas fiscal, monetária e estrutural para passar a um patamar de crescimento mais alto."

    Se essa observação vale para um mundo que está crescendo, pouco, mas crescendo, vale muito mais para o Brasil, atado a uma armadilha muito mais daninha: a recessão.

    Conclusão: o pacote Meirelles até agora anunciado pode ser necessário, mas é claramente insuficiente até na visão de templos neoliberais.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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