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    Clóvis Rossi

    É uma guerra, e está perdida no varejo

    26/07/2016 14h36

    Charly Triballeau/AFP Photo
    French policemen stand in the street during a search in a house on July 26, 2016 in the Normandy village of Saint-Etienne-du-Rouvray after a priest was killed in the latest of a string of attacks against Western targets claimed by or blamed on the Islamic State jihadist group. French President Francois Hollande said that two men who attacked a church and slit the throat of a priest had "claimed to be from Daesh", using the Arabic name for the Islamic State group. Police said they killed two hostage-takers in the attack in the Normandy town of Saint-Etienne-du-Rouvray, 125 kilometres (77 miles) north of Paris. / AFP PHOTO / CHARLY TRIBALLEAU ORG XMIT: 1177
    Policiais durante busca em área próxima de onde ocorreu ataque reivindicado pelo EI na França

    O presidente francês, François Hollande, tem razão quando diz que o Estado Islâmico declarou guerra a "nós", podendo traduzir-se o "nós" pelo mundo ocidental e cristão (não é casual que a mais recente vítima tenha sido um padre católico, Jacques Hamel).

    Pior: é uma guerra que pode até estar sendo vencida no atacado mas, durante um longo tempo, será perdida no varejo.

    Traduzindo: o Estado Islâmico, responsabilizado pelos ataques mais recentes, está perdendo territórios que ocupou no Iraque e na Síria e nos quais proclamou seu califado.

    Conforme reportagem de Isabel Fleck nesta Folha, a área controlada pelo Estado Islâmico encolheu 12%, ou 9.700 km², nos primeiros seis meses do ano. Em todo o ano de 2015, os radicais tinham perdido 12.800 km². Somados, dá metade do Estado do Rio de Janeiro.

    Essa derrota no atacado não impede que seus "soldados" aumentem os atentados longe do território ocupado, principalmente na França, mas, mais recentemente, também na Alemanha.

    Os alvos escolhidos se afastam dos grandes centros, hipervigiados, para buscar localidades pequenas como St.-Étienne-du-Rouvray, a 170 quilômetros de Paris e com apenas 29 mil habitantes, onde morreu o padre Hamel. Ou Ansbach, na Alemanha, de 40 mil habitantes.

    Esse tipo de ataque é praticamente impossível de controlar. Uma coisa é enfrentar um exército que necessita preservar a vida de seus integrantes para poder ocupar o território em caso de vitória. Outra é evitar a ação de quem não se incomoda de matar e morrer no mesmo ato –como tem ocorrido em todos os atentados terroristas recentes e não tão recentes.

    A única possibilidade, utópica, é vigiar todos os suspeitos, tarefa insana. O caso de Ansbach ilustra a dificuldade: as autoridades in­ves­ti­gam 59 re­fu­gia­dos por su­pos­tos víncu­los com o Es­ta­do Is­lâ­mi­co ou outros gru­pos is­la­mi­tas e têm informações sobre 400 outras pessoas que poderiam ser consideradas um perigo para a segurança.

    Nenhuma delas era o sírio que praticou o atentado em Ansbach. Tampouco estava no radar Mohamed Bouhlel, o franco-tunisiano que atacou Nice.

    Além disso, há o efeito imitação: qualquer desequilibrado, como o alemão-iraniano que matou nove pessoas em Munique, sente-se atraído ao ver, na televisão, a notoriedade adquirida pelos terroristas.

    Por isso mesmo, a sabedoria convencional manda dizer que mais mortes surgirão nos próximos dias ou semanas, o que tem um segundo efeito terrível, além da dor e insegurança que provocam: dá argumentos para a extrema-direita em sua campanha contra os imigrantes e contra os muçulmanos de modo geral.

    Cada vítima do EI acrescenta um voto para partidos como a Frente Nacional de Marine Le Pen na França e a Alternativa para a Alemanha, neste último país.

    crossi@uol.com.br

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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