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    Clóvis Rossi

    Apoio a Donald Trump na eleição cria sensação de que a América está doente

    03/11/2016 02h00

    Não há tarefa mais fácil do que a de criticar Donald Trump.

    Parodiando o sábio José Simão, o candidato republicano é a própria crítica pronta: cada vez que abre a boca, sai tanta barbaridade que basta reproduzi-las que a crítica já está feita.

    Pequena recapitulação do, digamos, breviário de Donald Trump:

    1 - Identificou os imigrantes mexicanos como violadores e criminosos.

    2 - Prometeu proibir a entrada de muçulmanos nos Estados Unidos.

    3 - Atacou um juiz do Estado de Indiana por sua origem mexicana.

    4 - Insultou o senador John McCain (de seu próprio partido), que foi prisioneiro de guerra no Vietnã e é considerado um herói.

    5 - Defendeu a tortura e o assassinato de civis como métodos antiterroristas.

    6 - Aceitou o apoio de grupos da extrema-direita neonazista.

    7 - Incitou os norte-americanos a ver um vídeo sexual inexistente de uma ex-miss Universo que ele já havia ofendido.

    8 - Insultou a família de um soldado morto no Iraque, além de uma jornalista da Fox (pró-republicanos).

    9 - Estimulou a Rússia a roubar correios eletrônicos de sua adversária, Hillary Clinton.

    10 - Gabou-se de sua "esperteza" para escapar do pagamento de impostos (de maneira que, agora, o "New York Times" afirma ser possivelmente fraudulenta).

    Vale ainda citar que praticamente toda a mídia "mainstream" declarou apoio a Hillary Clinton, parte dela pela primeira vez na história.

    Não obstante tudo isso, Donald Trump chega à semana final da eleição em empate técnico com Hillary.

    Nessa situação, me parecem insuficientes as explicações usadas até agora, inclusive por mim, para esse fenômeno.

    A sensação que fica é que a América está doente. O que a leva a apoiar, em tão grande número, um candidato preconceituoso, misógino, mentiroso, debochado, cínico?

    Se o país estivesse de fato em uma crise terminal como gosta de dizer Trump, ainda vá lá. Mas essa pregação é outra falsidade: a economia dos Estados Unidos é hoje 15% maior do que era quando assumiu Barack Obama, o grande apoiador de Hillary e, por extensão, o grande adversário de Trump.

    Há 7% mais pessoas empregadas. O desemprego está em 5%, nível que em outras épocas era considerado virtual pleno emprego.

    No terceiro trimestre, a economia cresceu 2,9% em termos anuais. Não chega a ser um tremendo "boom", mas está longe de ser um desastre que explique o voto na oposição.

    Claro que a desigualdade cresceu, como cresceu no mundo todo nos últimos anos. Mas combater a desigualdade não é exatamente o programa que caracteriza a candidatura Trump.

    Ao contrário, seus truques e sua maneira de fazer negócios são emblemáticos de um capitalismo selvagem que está na origem do crescimento das desigualdades.

    Ao contrário dos petistas que culpam os eleitores quando perdem eleições, acho mais razoável sugerir que se estude a alma deles, para chegar –e eventualmente corrigir– esse difuso mal-estar que gera o "trumpismo".

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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