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    Clóvis Rossi

    Crise enorme, governo nanico

    01/12/2016 02h00

    Campanha presidencial de 1989: o candidato Luiz Inácio Lula da Silva fica retido em Londrina, porque dependia de voos regulares. Não havia ainda se metido na promiscuidade com empreiteiras, hoje escancaradas, que lhe permitiriam o uso de jatinhos particulares.

    Já Fernando Collor de Mello rasgava o país de norte a sul, sem trégua e sem sustos.

    Cansado da espera em Londrina, José Carlos Espinoza, uma espécie de segurança de Lula, sobrenome e alma de filósofo, desabafou:

    "Quer saber, Lula? Se tudo der certo, se nada sair errado, se tudo for perfeitamente bem, nós estamos é ferrados". (Ferrados não foi bem a palavra que ele usou, mas é a que cabe aqui).

    É razoável supor que 11 de cada 10 analistas de Brasil, se forem sinceros como Espinoza, diriam o mesmo sobre o país nestes tempos em que desgraça pouca é bobagem.

    Em um dia, cai um avião que mata a esperança de uma equipe de tão competente gestão que lhe permitiu chegar às portas do paraíso.

    No seguinte, sai o número do retrocesso da economia que demonstra o quanto gestões incompetentes remeteram o Brasil ao inferno.

    Com a devida linguagem formal, o Iedi (Instituto de Estudos do Desenvolvimento Industrial) de certa forma repete Espinoza ao tratar do emprego/desemprego, que é o reflexo do abstrato PIB na vida real:

    "O quadro do emprego terminará 2016 muito provavelmente sem indícios de melhora, a contar pelos dados divulgados pelo IBGE [12 milhões de desempregados]. A redução da taxa de desemprego deve ficar para a segunda metade de 2017, ainda assim com dose de otimismo".

    Vista de fora, a situação do Brasil cabe na análise de Espinoza: "O governo de Michel Temer no Brasil está condenado a viver contra as cordas e no fio da navalha até que abandone o Planalto em 1º de janeiro de 2019" (Rogelio Núñez, em Infolatam).

    Do meu ponto de vista, o problema mais grave é que o governo Temer é nanico demais para o tamanho da crise, inédita na República.

    Basta lembrar que, com mais de 30 anos de vida pública, Temer jamais teve dimensão política suficiente para ser lembrado como candidato nem sequer a prefeito, quanto mais para governador e, menos ainda, presidente da República.

    Seu limite de competência é o PMDB, partido que não tem candidato à Presidência desde 1994. São 22 anos sem a necessidade de pensar o país mesmo que fosse apenas para elaborar programas de fantasia que os partidos em geral encomendam à meia dúzia de técnicos e acadêmicos e não são nem mesmo lidos, passada a eleição.

    Ainda por cima, Temer delegou a sorte do governo a Henrique Meirelles, que não é um formulador. No máximo, bom gerente, ao menos para quem gosta do pensamento único que manda equilibrar as contas públicas como pomada maravilha que cura todos os males da pátria.

    A crise demanda mais do que um gerente, mas não está à vista nenhum estadista, mesmo na improvável hipótese de nova eleição, já ou em 2018.

    A filosofada de Espinoza continua valendo.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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