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    Clóvis Rossi

    Populismo vive e deixa marcas indeléveis na América Latina

    04/04/2017 14h04

    A vitória de Lenín Moreno nas eleições equatorianas de domingo (2) demonstra que eram prematuras as notícias de que o populismo entrara em irremediável decadência na América Latina. É um dado que precisa ser levado em conta em toda a América Latina.

    Pode até acontecer de, após uma eventual recontagem de votos, mudar o vencedor. Mas, ainda que ocorra essa improvável hipótese, permanecerá o fato de que a chamada "Revolução Cidadã" do presidente Rafael Correa, representada agora por Moreno, tem considerável prestígio.

    Mariana Bazo/Reuters
    O presidente do Equador, Rafael Correa (à esq.), e o seu aliado e vencedor da eleição, Lenín Moreno
    O presidente do Equador, Rafael Correa (à esq.), e o seu aliado e vencedor da eleição, Lenín Moreno

    A votação do primeiro turno, de resto, já havia demonstrado que o conglomerado Aliança País, de Correa e Moreno, é a força majoritária no Equador. Ficou a pouquíssimos votos de obter a vitória já no primeiro turno.

    Parece evidente que a força desse populismo se deve, em grande medida, aos programas sociais, responsáveis por uma redução da pobreza de quase 14 pontos percentuais nos seis primeiros anos dos dez que Correa governou (de 37% em 2007 para 23,6% em 2013).

    Era inevitável, pois, que até Guillermo Lasso, o banqueiro que era candidato da oposição, prometesse manter os subsídios sociais, em especial o Bônus de Desenvolvimento Humano, programa de transferências condicionadas que cobre a maior porcentagem de população em um país, 44%.

    Eis um dado que tem que ser levado em conta em toda a América Latina, Brasil inclusive: o populismo, tão criticado, em alguns casos é apenas o atendimento de demandas sociais por muito tempo deixadas de lado.
    Programas como o Bolsa Família (inspiração do Bônus de Desenvolvimento Humano do Equador) vieram para ficar.

    Quem se dispuser a derrubá-los não se elege ou, como Michel Temer, tem sua popularidade seriamente avariada. É verdade que Temer já assumiu com baixa popularidade, mas parece evidente que reformas tidas como impopulares (Previdência, terceirização, corte de gastos) ajudam a reduzi-la ainda mais.

    O problema, para o populismo, é que esse tipo de reformas pode ser necessário em determinadas circunstâncias. É o desafio que tocará a Lenín Moreno agora: com Rafael Correa, graças ao maná do petróleo a bom preço, o Equador foi o país sul-americano que mais aumentou o gasto público, segundo José Hidalgo (Instituto de Investigação Econômica Cordes).

    O gasto público passou de 25% do PIB a 44%. A participação do setor governamental nos investimentos totais foi de 20% para 52%, sempre segundo o Cordes.

    Agora que o preço do petróleo baixou e que o país está na sua primeira recessão em 17 anos, já não é mais possível tocar a mesma música.

    Resta saber se Lenín Moreno descobre a fórmula para equilibrar as contas sem afetar (muito) os programas sociais ou seu prestígio rolará ladeira abaixo (como o de Dilma Rousseff e de Cristina Kirchner, para não mencionar Nicolás Maduro, que não é um caso de populismo, mas de patologia política).

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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