Há dois aspectos fascinantes —- e interligados— na vitória de Emmanuel Macron nas eleições franceses deste domingo (7).
Não vou nem falar da derrota da extrema-direita, o que afasta do cenário europeu, pelo menos por enquanto, o fantasma desse anacronismo.
Patrick Kovarik/AFP | ||
Eleitores de Emannuel Macron celebram sua vitória diante do Louvre, em Paris |
O extremismo já havia sido batido na Holanda, perde agora na França e não parece ter a menor chance na Alemanha, em setembro. O fim do mundo, tão anunciado, não aconteceu.
Mais fascinante do que esse aspecto é o fato de que venceu um movimento encorpado de baixo para cima, o que é raro, talvez inédito.
É verdade que "En Marche", o movimento vitorioso, foi lançado de cima para baixo pelo próprio Macron que ainda teve o cabotinismo de dar-lhe as iniciais de seu próprio nome.
Mas só teve êxito porque foi abraçado por uma classe média liberal, cansada dos políticos tradicionais e do imobilismo que caracteriza o país. Na interpretação da jornalista Laurence Haïm, exposta a "El País", o que o movimento fez "foi canalizar uma energia de mudança que se percebia na sociedade francesa".
A entrevista Tanguy Bernard, o professor de Economia, a Diogo Bercito na Folha de domingo (7) é uma lufada de ar fresco em um ambiente político asfixiante (no mundo todo, aliás).
De alguma maneira, movimentos com certa semelhança cresceram na Espanha ("Podemos") e na Itália ("Movimento 5 Estrelas"), mas não conseguiram chegar ao poder.
De qualquer forma, convém prestar atenção a esse novo fenômeno porque, cedo ou tarde, acabam chegando ao Brasil.
Segundo aspecto fascinante —e aí no caso específico de En Marche— é que não se trata de uma mobilização antissistema, ao contrário do que acontece na Espanha e na Itália.
Trata-se, na França, de um movimento liberal, vitorioso em um país que tem amor pelo "étatisme".
Ou, posto de outra forma, não se trata de destruir o sistema, mas de corrigir os seus excessos.
É importante, em todo o caso, ter claro que os votos de Macron não são todos pelo seu liberalismo. Ganhou porque o extremismo xenófobo e fascistóide de Marine Le Pen provoca uma rejeição ainda majoritária.
Para que os aspectos fascinantes da vitória de Macron se tornem de fato realidade é preciso esperar as eleições legislativas do mês que vem. Se "En Marche" conseguir uma votação expressiva, Macron estará em condições de tentar operar o milagre de juntar o melhor da esquerda, o melhor da direita e até o melhor do centro, como prometeu na campanha.
Se não conseguir, terá que compor com a velha política e condenar seu movimento a uma senilidade precoce.
É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.