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    Clóvis Rossi

    O criminoso maior é o capitalismo mafioso

    20/05/2017 12h01

    Danilo Verpa/Folhapress
    Joesley Batista, dono da JBS, concede entrevista a Folha na sede da empresa em São Paulo.
    Joesley Batista, dono da JBS, na sede da empresa, em São Paulo

    Em meio ao tsunami de acusações a políticos de todas as cores, corre-se o risco de ficar escondido num cantinho o grande criminoso, que é o capitalismo tal qual praticado no Brasil (haverá quem diga que é o capitalismo "tout court", mas aí entrar-se-ia em outra discussão).

    Vou dizer uma obviedade, mas até obviedades se tornam necessárias quando se assiste, no horário nobre da TV, o deboche que foram os depoimentos da turma da JBS: para haver corrompidos, é indispensável que haja corruptores.

    Simples assim.

    Pior: são corruptores confessos, pelo menos nos casos da Odebrecht, da OAS e, agora, da JBS. A Odebrecht emitiu nota oficial, na qual admite ter adotado "práticas impróprias".

    É uma confissão agravada pela desfaçatez. Práticas impróprias é dizer muito pouco para a escala de corrupção praticado.

    A JBS também adotou a mesma técnica de confissão, mas com uma desfaçatez ainda maior: insinuou que fez o que fez porque foi obrigada pela maneira usual de se relacionar com os poderes públicos no Brasil.

    Corruptos, corruptores e cínicos: até parece que os que receberam recursos da empresa procuraram seus executivos com uma metralhadora na mão, prontos a dispará-la se não se recebessem a dinheirama que pediam.

    Uma brilhante análise desse capitalismo mafioso está no artigo de Bruno Carazza para a Folha deste sábado (20). É imperdível de A a Z, mas vale ressaltar um trecho que generaliza corretamente:

    "De acordo com as regras de funcionamento do nosso capitalismo de compadrio, o sucesso de boa parte de nossas grandes empresas foi construído mediante corrupção, sonegação de impostos e lavagem de dinheiro. No melhor estilo 'rent seeking', nossos empresários investem em "relações institucionais" em vez de bens de capital, tecnologia e produtividade da mão-de-obra".

    Eu só trocaria "capitalismo de compadrio" por "capitalismo mafioso". Os envolvidos, de um lado e outro do balcão, não são apenas compadres, são uma organização criminosa.

    Por que as Nações Fracassam
    Daron Acemoglu, James A. Robinson
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    Carazza também deixa claro que os corruptores, pelo menos no caso da JBS, escapam com punições pecuniárias absurdamente leves. Ou, posto de outra forma, fica claro que o crime compensa para os grandes criminosos, embora possa, quando descoberto (tardiamente), pôr na cadeia alguns (poucos) corrompidos.

    Não se trata apenas de um problema ético e moral, o que seria por si só bastante grave. É também uma questão de construção de um país. Carazza cita o livro "Por que as Nações Fracassam?", de Daron Acemoglu e James Robinson, para afirmar: "A principal conclusão do livro é que sociedades que permitem uma relação umbilical entre sua elite econômica e o grupo que ocupa o poder tendem a produzir políticas públicas concentradoras de renda e antidemocráticas".

    É o Brasil desde sempre.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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