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    Clóvis Rossi

    Trump finalmente acertou ao instar islâmicos a liderar luta contra terror

    25/05/2017 02h00

    Temo me arrepender amargamente amanhã ou depois do texto que se segue, mas é forçoso dizer que, pela primeira vez, o presidente Donald Trump parece ter dado na tecla certa em sua visita à Arábia Saudita.

    O atentado de segunda-feira (22) em Manchester só reforça essa impressão, aliás. O que fez o presidente? Delegou aos líderes muçulmanos o essencial do combate ao radicalismo ao visitar o novo Centro para o Combate à Ideologia Extremista, na capital saudita.

    Mandel Ngan - 22.mai.2017/AFP
    O presidente dos EUA, Donald Trump, embarca rumo a Israel após passagem pela Arábia Saudita
    O presidente dos EUA, Donald Trump, embarca rumo a Israel após passagem pela Arábia Saudita

    O centro —disse Trump— representa "uma clara declaração de que países de maioria muçulmana têm que assumir a liderança no combate à radicalização". Fez, ainda, apelo direto aos líderes religiosos muçulmanos para que "de forma absolutamente clara" digam que, se os fiéis "escolherem o caminho do terror, a vida deles será vazia, será breve e suas almas serão condenadas".

    Pode até não funcionar, mas até agora não deram resultado pregações de outras religiões, declarações enfáticas de líderes políticos, nem ações armadas ou a decretação de alerta máximo. Os números são claros: só este ano, já foram praticados 388 ataques terroristas em 52 países, com 2.305 mortes.

    É bom deixar claro que a grande maioria dos atentados (e das vítimas) ocorre em países de maioria muçulmana. Viviam neles 82% das vítimas, conforme levantamento da Universidade Austral (Argentina).

    Faz sentido, portanto, que os líderes religiosos muçulmanos contraponham a condenação das almas, pregada por Trump, à cantilena dos radicais que dizem estar combatendo a "flauta da morte", expressão cunhada por Osama bin Laden para designar a música que os "infiéis" adoram ouvir.

    O atentado de Manchester é a enésima demonstração de que os extremistas atacam acima de tudo a "joie de vivre" de uma juventude que acredita, com razão, que a "flauta da morte" de Bin Laden é, ao contrário, um acorde de alegria.

    Como a grande maioria dos atentados é praticada por muçulmanos radicalizados, como aconteceu em Manchester, só a pregação de seus líderes religiosos pode eventualmente convencê-los de que o terrorismo levará suas almas a serem condenadas, como quer Trump, em vez de conduzi-los ao paraíso.

    A vigilância policial não dá conta da tarefa: segundo a "The Economist", o serviço britânico interno de inteligência, o MI5, tem no seu radar cerca de 3.000 pessoas rotuladas como extremistas religiosos, mas só dispõe de recursos para monitorar constantemente 40 deles.

    Uma vigilância de 24 horas de um único suspeito requer até 18 policiais, além de haver regras estritas sobre quanto tempo pode durar o monitoramento de um indivíduo.

    Assim como Salman Abedi, o acusado pelo atentado de Manchester, viajou à Líbia para retornar à cidade —e matar—, 20% dos que viajaram ao Iraque e à Síria para juntar-se aos extremistas saíram da Europa.

    Que voltem e que matem é uma grande probabilidade. Só mesmo conquistar suas mentes e corações pode evitar que, de novo, transformem em pesadelo o que era um sonho, o de ver o show de Ariana Grande, como chorou uma sobrevivente.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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