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    Clóvis Rossi

    Só a esquerda implode o chavismo

    11/06/2017 01h07

    Christian Veron-31.mai.17/Reuters
    Demonstrators clash with riot security forces while rallying against Venezuela's President Nicolas Maduro in Caracas, Venezuela, May 31, 2017. REUTERS/Christian Veron TPX IMAGES OF THE DAY ORG XMIT: AST101
    Manifestantes protestam contra o governo de Nicolás Maduro em Caracas

    Representantes da CEV (Conferência Episcopal Venezuelana) estiveram no Vaticano para discutir com o papa Francisco a interminável agonia do país. Depois do encontro, o presidente da CEV, monsenhor Diego Padrón, resumiu assim a situação, segundo "El País":

    "O papa não entende como um país com tantos recursos pode chegar ao extremo de não ter comida nem remédios.

    Caro papa, é fácil entender. O próprio monsenhor Padrón explica: "O governo deve admitir que suas políticas são erradas".

    O problema desse diagnóstico, absolutamente correto, é que o governo do presidente Nicolás Maduro não admite nada e, ao contrário, foge para a frente, ao convocar uma Assembleia Constituinte de formato nitidamente fascistoide.

    É importante lembrar que a Constituição vigente não é obra da "direita", mas foi feita à imagem e semelhança de Hugo Chávez. Só eu recebi, em momentos diferentes, três exemplares de bolso da Constituição, presentes do próprio Chávez.

    A proposta de Constituinte é tão fascistóide que até a procuradora-geral Luisa Ortega Díaz, até há pouco fiel chavista, entrou com ação contra a convocação, apontando violação aos avanços dos direitos humanos, à legalidade administrativa, ao direito ao sufrágio, à legalidade do voto e ao princípio da soberania constitucional.

    Não é pouco, mas é improvável que a ação prospere porque o chavismo eliminou a independência dos poderes na Venezuela e tornou o Judiciário um mero apêndice do Executivo.

    Ainda assim, a iniciativa de Ortega Díaz é um primeiro e tímido sinal de que podem começar a dar-se as condições para que se chegue a uma negociação honesta, única saída à vista para a crise.

    Pelo menos é o que se pode deduzir do teorema exposto por Luis Vicente León, diretor do Datanalisis, respeitado centro de pesquisas e análises venezuelano.

    León acha que o "elemento central" é a negociação, mas, "antes, passa por uma fratura ou implosão dentro do chavismo". Depois, sim, viria a negociação.

    Se a dissidência aberta pela procuradora-geral ganhar adeptos entre os chavistas, pode ser que se produza, cedo ou tarde, a fratura ou implosão do chavismo.

    No site Aporrea —que defende o legado deixado por Hugo Chávez e o chamado socialismo do século 21— já há quem apoie a procuradora-geral. Caso, por exemplo, de Edgar Perdomo Arzola, analista de políticas públicas e frequentador assíduo de "Aporrea". Seu mais recente artigo pergunta, no título, "Luisa Ortega Díaz derrotará a Constituinte do terror?".

    Suspeito que a resposta só será "sim" se a esquerda latino-americana e, em especial, a brasileira demonstrar um tiquinho de lucidez e admitir, como os bispos venezuelanos, que as políticas de Maduro estão erradas, de A a Z.

    Que a direita o diga, não adianta. Maduro e os seus fingem que há uma conspiração contra eles e descartam qualquer crítica.

    O ponto, aqui, é simples: não se trata de um regime de esquerda, mas de uma ditadura. Ponto. De uma ditadura fracassada. Ponto.

    Salvar a Venezuela de tal fracasso não é uma questão ideológica, mas humanitária.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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