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    Clóvis Rossi

    Aos 74 anos, nunca votei sem que Lula fosse candidato

    14/07/2017 11h25

    Sou um velhinho de 74 anos, mas, com todo o peso dessa idade, jamais votei para presidente da República sem que um certo Luiz Inácio Lula da Silva estivesse presente na cédula ou na urna eletrônica. Ou ele próprio (1989, 1994, 1998, 2002 e 2006) ou pela interposta pessoa de seu poste, no caso Dilma Rousseff (2010 e 2014).

    Na última eleição presidencial antes do golpe (novembro de 1960), estava a dois meses de completar os 18 anos, idade mínima para votar na época.

    Depois, foram 29 anos até a eleição legítima seguinte (1989).

    Dá para dizer, portanto, que faz mais de meio século (ou exatos 57 anos) em que ou não se pensava em eleições presidenciais ou se pensava nelas em torno de Lula.

    Significa que se Lula for impedido de concorrer em 2018, os esquemas mentais de eleitores e políticos terão que trocar de chip.

    Pedro Ladeira - 5.jul.2017/Folhapress
    Ex-presidente Lula é condenado a nove anos e meio de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro
    O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante cerimônia em Brasília

    Parêntesis: a julgar pelas declarações do presidente do Tribunal Federal Regional 4 (Porto Alegre), Carlos Eduardo Thompson Flores, há uma razoável perspectiva de que a condenação do ex-presidente seja ratificada pela segunda instância, que, no caso, é exatamente esse tribunal.

    Disse ele ao Jornal Nacional de quinta-feira (13) sobre a sentença de Sergio Moro:

    "São 218 páginas, eu li. Uma sentença, como lhe disse, pode-se gostar dela e pode-se não concordar com ela. Para isso existem os recursos. Mas uma coisa é preciso reconhecer, foi muito bem trabalhada".

    Thompson Flores rechaçou a tese de Lula de que se trata de "uma perseguição política". Afirmou: "Respeito a posição dele, mas não concordo".

    O presidente do Tribunal não vota mas é razoável supor que seus pares tenham uma cabeça ao menos parecida, não?

    Fecha parêntesis e voltemos ao ineditismo eventual do pleito de 2018.

    Primeiro, não creio na viabilidade de qualquer novo poste a ser inventado por Lula, no caso de ser impedido de concorrer. O caso Dilma foi excepcional: o Brasil crescera 7,5% no último ano de Lula, o desemprego era residual e a pobreza diminuíra (bem menos do que diz a propaganda lulista, mas diminuíra; no último ano completo de Dilma, após 13 anos de lulo-petismo, ainda havia 73 milhões de pobres no Brasil, mais do que a população total de todos os países da União Europeia, exceto Alemanha).

    Além disso, fica o fato de que caudilhos, como Lula, impedem que cresça até grama no seu quintal, quanto mais uma palmeira que lhe possa fazer sombra.

    O PT hoje é Lula e pouco mais.

    Em tese, portanto, não será mais necessário o terrorismo empresarial de dizer que 800 mil empresários abandonariam o país se Lula fosse eleito, como fez Mário Amato, então presidente da Fiesp, na campanha de 1989.

    Consequência inescapável: os candidatos de 2018 terão que construir um discurso que não seja apenas contra algo (no caso, contra Lula) mas a favor de um projeto de país capaz de entusiasmar o público.

    É óbvio que será também preciso que os partidos escolham candidatos que não estejam citados na Lava Jato –uma tarefa nada fácil.

    Fernando Henrique Cardoso vendeu o controle da inflação e ganhou duas eleições seguidas, ambas no primeiro turno.

    Lula vendeu ilusões e ganhou quatro seguidas, com ele próprio ou com Dilma.

    Hoje, não há uma inflação que seja aterradora e não estão à vista ilusões oferecidas no mercado político-partidário.

    Aliás, mesmo que Lula venha a ser candidato, não há mais ilusões que possa vender. Seu repertório é arqui-conhecido.

    Tudo somado, caminhamos para uma eleição inédita até para quem, como eu, cobriu todas as que houve pós-ditadura.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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