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    Clóvis Rossi

    A extrema-direita virou normal

    15/10/2017 02h00

    A eleição deste domingo (15) na Áustria tende a ser a mais recente demonstração de que as votações, em boa parte do mundo, estão se reduzindo a uma disputa entre a direita e a extrema-direita. Pior: a ascensão da extrema-direita é o, digamos, novo normal.

    Exemplo mais recente, a França: na eleição de abril, o alarme estava dado apenas pela possibilidade de que a extrema-direita de Marine Le Pen chegasse ao poder. Não se discutia mais —ou seja, normalizou-se— o fato de que ela chegaria ao segundo turno, como chegou.

    Alex Halada - 13.out.2017/AFP
    Manifestantes protestam contra o partido de extrema direita FPÖ em Viena, na Áustria, na sexta-feira (13)
    Manifestantes protestam contra o partido de extrema direita FPÖ em Viena, na Áustria, na sexta-feira (13)

    Na Áustria deste outubro, é mais ou menos a mesma coisa: não há a excitação provocada no ano 2000 quando o FPÖ (Freiheitliche Partei Österreichs ou Partido da Liberdade Austríaco) foi admitido na coalizão governista. A Europa até puniu a Áustria na ocasião. Agora, o FPÖ está em segundo lugar nas pesquisas, com 25% das intenções de voto, atrás apenas do ÖVP (Österreichische Volkspartei ou Partido Popular, conservador), com 33%.

    Salvo recuperação de último momento, confirmar-se-á o declínio da esquerda: o atual chanceler da Áustria (primeiro-ministro), Christian Kern, social-democrata, deve ficar em terceiro lugar.

    Nada impede, claro, que haja um acordo entre "populares" e social-democratas para formar uma coalizão que deixe de fora a extrema-direita. Mas nada impede tampouco que a coligação seja da direita com a extrema-direita —um sinal definitivo da aceitação desta última pelo "mainstream" político.

    Há analistas que atribuem a chamada normalização a uma guinada para a moderação do FPÖ. Na prática, o único sinal real de moderação foi o abandono do antissemitismo que caracterizava o partido. É bom lembrar que, na França, Marine Le Pen também conduziu a sua Frente Nacional para mais longe do antissemitismo, sem, no entanto, abandonar a xenofobia.

    No caso da Áustria, o Partido da Liberdade defende rejeitar a entrada de mais imigrantes, o que é coerente com a pregação de seu líder, Heinz Christian Strache, de que "o islã não é parte da Áustria".

    Seu partido entende que Angela Merkel, a chanceler alemã, está "destruindo a Europa" por sua política de portas abertas. Já não tão abertas, aliás, agora que Merkel, para agradar a seus sócios cristão-democratas, aceitou pôr limites à chegada de novos imigrantes.

    A Áustria, com população de apenas 8,7 milhões, recebeu 150 mil imigrantes desde 2015, um número considerável e que serve de combustível para o crescimento de um partido xenófobo, a exemplo do que ocorreu na Alemanha com o AfD (Alternativa para a Alemanha).

    A grande diferença é que, na Alemanha, a negociação para a formação do governo após a eleição de setembro exclui a extrema-direita. Na Áustria, dependendo, claro, do resultado deste domingo, fala-se com naturalidade de Heinz Christian Strache como vice-chanceler.

    Não pense que o Brasil é diferente. Basta ver como Jair Bolsonaro sobe nas pesquisas.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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