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    Clóvis Rossi

    Houve duas eleições na Catalunha; na implícita, a independência perdeu

    22/12/2017 13h06

    O independentismo ficou com a maioria absoluta na eleição catalã de quinta-feira (21), certo? Não exatamente. Acontece que havia duas eleições em curso: a formal —quem formaria o novo governo catalão— e a plebiscitária, quem era a favor ou contra a independência.

    Para formar governo, de fato, os grupos pró-independência tiveram maioria absoluta: conquistaram 70 cadeiras, duas a mais das 68 que compõem a maioria absoluta.

    Mas para chegar a esse número é preciso juntar água e óleo.

    O grupo independentista reúne o "Juntos pela Catalunha" (34 cadeiras), o novo nome do partido que tradicionalmente representou o conservadorismo regional; ERC (Esquerda Republicana de Catalunha), 32 cadeiras, que é de esquerda e republicano, como o nome diz, e foi oposição ao hoje parceiro "Juntos", até que as lideranças deste resolveram lançar o chamado "processo independentista"; e, finalmente, a CUP (Candidatura de Unidade Popular), 4 cadeiras, partido que é anti-sistema, anti-capitalista e anti-União Europeia —-crítico feroz, naturalmente, dos partidos do sistema, como o "Juntos" sempre foi.

    Podem até formar governo, se limitarem o acordo para tanto à defesa da independência, o que não é suficiente para tocar a administração do dia a dia.

    No voto plebiscitário, no entanto, ganhou o bloco anti-independência: somou 50,94% dos votos, maioria absoluta portanto. Fazem parte dessa maioria os seguintes grupos:

    1. Cidadãos, partido relativamente novo de centro direita, que aliás foi o mais votado de todos (37 cadeiras e 25,37% dos votos);
    2. PSC (a versão catalã do Partido Socialista), 17 cadeiras, 13,88% dos votos;
    3. PP (Partido Popular, conservador, no poder em Madri), 3 cadeiras, 4,24% dos votos.
    4. Catalunha em Comum-Podemos, grupo nascido da sociedade civil e que elegeu em 2015 a prefeita de Barcelona, Ada Colau. Oito cadeiras, 7,29%.

    Este último partido condenou tanto a DUI (declaração unilateral de independência), promovida pelo governo da Catalunha, como a intervenção do governo central na região, provocada exatamente pela DUI, manifestamente ilegal, conforme decisão do Tribunal Constitucional.

    Os partidos que proclamaram a DUI somaram 47,49% dos votos, três pontos percentuais menos, portanto, do que os contrários a ela.

    Só tiveram maioria de cadeiras, embora não de votos, pelo sistema proporcional que acabou favorecendo regiões em que o Cidadãos, relativamente novo, penetra pouco (ganhou em Barcelona, com certa folga, mas perdeu em Girona e Lleida).

    Tudo somado, parece claro que a mensagem que emerge das urnas pode ser lida assim: grande parte dos catalães quer a independência (ou, pelo menos, mais autonomia) mas a maior parte ou a rejeita, pura e simplesmente, ou só a aceita se for negociada com Madri.

    Mariano Rajoy, o presidente do governo espanhol, já disse que aceita o diálogo com o provável novo governo catalão. Resta ver se este se dispõe a conversar sem colocar como pré-condição a independência. Se o fizer, a crise na Catalunha volta ao ponto de partida.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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