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    Clóvis Rossi

    Indulto a Fujimori isola ainda mais presidente do Peru

    25/12/2017 14h35

    Mariana Bazo - 21.dez.2017/Reuters
    O presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski
    O presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski

    Se já era, desde a eleição, um presidente solitário, o presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, mais conhecido como PPK, só fez acentuar sua tremenda solidão ao conceder indulto ao ditador Alberto Fujimori.

    Mal se anunciou a graça presidencial a Fujimori, Alberto de Belaunde renunciou à sua cadeira na bancada de "Peruanos por el Kambio", a coligação pela qual o presidente se elegeu. Como a bancada é formada por apenas 18 deputados em um total de 130, qualquer defecção é um golpe duro.

    Renúncia que se deve à convicção de que Kenji Fujimori, filho do ditador e um dos líderes de "Fuerza Popular", coligação majoritária no Congresso, se opôs ao processo de destituição do presidente, contra a maioria de sua própria bancada, em troca do indulto ao pai.

    PPK escapou por apenas oito votos, mas teve a maioria absoluta dos congressistas contra ele: 79 (em 130) votaram a favor de afastá-lo, sob a acusação de "incapacidade moral" para governar, por ter mentido sobre recebimento de propinas da construtora brasileira Odebrecht.

    Só 19 foram contra e 21 se abstiveram. Para decapitá-lo, eram necessários dois terços dos deputados - 87.

    Luis Camacho - 25.out.2013/Xinhua
    O ditador Alberto Fujimori, durante audiência judicial em Lima
    O ditador Alberto Fujimori, durante audiência judicial em Lima

    Acentua a solidão de PPK o fato de que a esquerda peruana, parte da qual o apoiou no processo da semana passada, foi a chave para elegê-lo em 2016. Na verdade, PPK não ganhou; foi Keiko Fujimori, também filha do ditador, quem perdeu.

    A rejeição ao fujimorismo, do qual ela é hoje a principal cabeça visível, fez com que todas as demais forças se unissem contra ela e acabassem dando a Presidência a PPK. Mais ou menos como ocorre sempre contra Marine Le Pen, a extremista francesa de direita.

    Acontece que a esquerda, mais que nenhuma outra corrente, tem ódio a Fujimori, pelos massacres promovidos em sua gestão. Para liquidar o grupo guerrilheiro "Sendero Luminoso", Fujimori desencadeou uma repressão sem limites que alcançou quem nada tinha a ver com a guerrilha.

    Mas a eliminação desse grupo ensandecido lhe conferiu prestígio em alguns setores populares - vítimas, eles também, da loucura do "senderismo".

    O indulto ao patriarca do grupo tende a acentuar a luta interna pela liderança entre os irmãos Keiko e Kenji, batalha em que PPK pode ser vítima de balas perdidas - como de resto aconteceu no processo de impedimento, proposto originalmente por Keiko, aliás ela também acusada de envolvimento no chamado "escândalo Odebrecht".

    Das 21 abstenções, que, na prática, salvaram o mandato do presidente, metade veio de aliados de Kenji no fujimorismo e metade da esquerda.

    O indulto a Fujimori afasta de vez a esquerda do presidente, sem que ele possa ter como certo o apoio do grupo de Kenji, porque, em política, não existe gratidão mas existe ambição - e Kenji e Keiko ambicionam o poder que PPK mal consegue exercer.

    clóvis rossi

    É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.

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