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    Edgard Alves

    História para boi dormir

    10/08/2013 03h00

    Virou maldito o material da demolição do velódromo de Jacarepaguá, uma batata quente na qual pôr a mão pode resultar em grave queimadura. Reportagem de Michel Castellar, no jornal "Lance!", informa que o Ministério do Esporte desistiu de levar para Goiânia o velódromo usado no Pan-2007, no Rio.

    A notícia torna mais sólida a ideia de que tal transferência não passa de uma história para boi dormir.

    Como transportar uma praça de esportes de concreto, com arquibancadas, portarias, vestiários, dependências administrativas, bilheterias, sanitários para o público e demais dependências do Rio para Goiânia ou para qualquer outra cidade interessada?

    Lógico que apenas parte daquela praça esportiva pode ser reaproveitada. O conto da transferência tem como alvo justificar a demolição sob a ótica de suposto reaproveitamento, driblando o desperdício. O velódromo custou R$ 14 milhões, e a sua demolição agora, apenas seis anos depois, foi exigência para que um outro, moderno, seja levantado, também no Rio, no padrão olímpico, com orçamento de cerca de R$ 134 milhões.

    A diferença entre esses valores dá arrepios. Por isso, a estratégia de abordar uma demolição difícil de justificar usa o tom de reaproveitamento em outra cidade, o que, psicologicamente, ameniza o abuso, torna menor a sensação de perda, de usurpação.

    Como o Ministério do Esporte foi quem custeou a instalação ciclística do Pan, o governo federal deve arcar com os custos de transporte do material do desmonte até Goiânia ou outra cidade interessada que apresente um projeto para o reaproveitamento.

    Um equipamento idêntico hoje custa ao redor de R$ 22 milhões, e o transporte de uma instalação do mesmo porte tem orçamento entre 50% e 65% do seu valor.

    Assim, só a transferência consumirá cerca de R$ 12 milhões. E quanto mais será necessário para levantar a praça que abrigará esse equipamento?

    Seria reaproveitado, em especial, o piso da pista de competição, de madeira siberiana. Estranhamente, a pista acabou descartada como palco de grandes eventos porque não permitia aos ciclistas alcançar velocidade de até 85 km/h. Alegou- -se que o ângulo de inclinação da pista seria a causa do problema. Outro entrave teria sido a ausência de climatização no local.

    Por que não houve cobrança de responsabilidade? Como uma pista recém-construída apresentou tais problemas? As contas, no entanto, foram pagas, lógico que com dinheiro do contribuinte.

    O Ministério do Esporte, a Prefeitura do Rio e o comitê Rio-2016, organizador da Olimpíada, devem tornar mais transparente o projeto de reaproveitamento do espólio do velódromo do Pan. Por exemplo, é preciso saber quanto vai custar, no final das contas, o projeto total que absorverá o material do Rio. Vai valer a pena tanto esforço, gastar mais, para montar outro palco de segunda linha?

    edgard alves

    Jornalista esportivo desde 1971, escreve sobre temas olímpicos. Participou da cobertura de seis Olimpíadas e quatro Pan-Americanos. Escreve às terças.

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