• Colunistas

    Sunday, 05-May-2024 22:49:33 -03
    Edgard Alves - Rafael Reis

    Para punir, o esporte muda procedimentos

    DE SÃO PAULO

    21/10/2014 02h00

    A língua solta, reverberando boçalidades, tem surpreendido muitos provocadores, arrogantes e incautos nos meios esportivos mundiais. Recentemente, uma torcedora foi flagrada pela TV ao ofender o goleiro Aranha, do Santos, com provocações racistas. Arrumou sarna para se coçar e uma punição para o seu clube.

    Comportamentos desse tipo ou motivados por outras questões (machistas, sexuais, homofóbicas, políticas etc) têm acarretado punições no mundo dos esportes. Todos os cantos do planeta registram casos.

    Outra mostra de que os procedimentos estão mudando é a manifestação do Comitê Olímpico Internacional, que vai incluir nos contratos das futuras sedes dos Jogos uma cláusula de garantia de que as Olimpíadas fiquem livres de qualquer forma de discriminação. É o resultado da repercussão negativa e protestos pouco antes dos Jogos de Inverno de Sochi, no início do ano, causados por uma controversa lei russa antipropaganda gay.

    Resta saber se o COI manterá essa coerência diante de questões polêmicas como a dos Jogos do México-68. Dez dias antes da abertura da Olimpíada, o espírito olímpico de busca pela paz foi manchado pelas tropas do governo mexicano que fuzilaram estudantes durante manifestações, o Massacre de Tlatelolco.

    Apesar daquelas mortes, a imagem que ficou daqueles primeiros Jogos realizados na América Latina foi a dos afro-americanos Tommie Smith e John Carlos, ouro e bronze nos 200 m rasos, com seus braços esticados, mãos cobertas por luvas negras e punhos fechados em protesto contra a segregação racial em seu país. Ambos acabaram expulsos da delegação dos EUA e da vila olímpica.

    As três Olimpíadas seguintes expuseram problemas ainda mais graves. Em Munique-72, integrantes do grupo terrorista Setembro Negro invadiram os alojamentos de Israel, mataram atletas e fizeram nove reféns. Todos acabaram mortos. As competições tiveram sequência depois da polêmica frase do presidente do COI, Avery Brundage: "Os Jogos devem continuar".

    Em Montreal-76, foi a vez do boicote de 26 nações africanas, lideradas pela República do Congo, em protesto pelo COI não afastar a Nova Zelândia, cuja equipe de rúgbi havia excursionado pela África do Sul, suspensa da comunidade internacional por causa da sua política racista do apartheid.

    Moscou-80 e Los Angeles-84 provocaram um racha completo no movimento olímpico dando sequência aos boicotes. Primeiro, sob a liderança dos EUA, 69 países se recusaram a ir à Moscou, sob a justificativa de protesto contra a invasão do Afeganistão pelos soviéticos. Quatro anos depois, o revide. Exceto Romênia, República Popular da China e Iugoslávia, o bloco de países socialistas, liderado pela URSS, não carimbou os passaportes para Los Angeles.

    Como episódios semelhantes seriam tratados na atualidade? Registros de assuntos controversos seguem presentes, exemplos não faltam. O proprietário do Los Angeles Clippers, Donald Sterling, foi convidado a se retirar da equipe e da NBA, a liga de basquete da América do Norte, por ter sido flagrado em áudio ofendendo de forma racista sua namorada.

    Ainda no basquete, o locutor oficial do ginásio, uma espécie de narrador de pontos e animador de torcida, acabou afastado da função por ter pronunciado a frase "quem poderia passar uma noite com as Dreamcheers" durante uma pausa de jogo válido pelo recente Mundial masculino. Tudo aconteceu a partir de uma música que havia acabado de ser reproduzida pelos alto-falantes enquanto as cheerleaders dançavam. A música, chamada "Bailando" (Dançando), possui um trecho que diz: "Quero estar contigo, dançar contigo, ter contigo uma noite louca...".

    Outro cartola acaba de trocar suas regalias no exercício da função por dores de cabeça ao não conter seus instintos. Shamil Tarpischev, presidente da Federação Russa de Tênis e membro do Comitê Olímpico Internacional, durante um programa de TV de seu país, referiu-se às norte-americanas Venus e Serena, jogadoras de porte físico avantajado, como os 'irmãos' Williams.

    Imediatamente, a Associação das Tenistas Profissionais (WTA) multou o dirigente em US$ 25 mil, aplicou-lhe suspensão por um ano de participar do circuito da entidade e manifestou o desejo de que o cartola seja retirado do cargo de promotor do WTA de Moscou, torneio durante o qual ocorreu o fato. A fala de Tarpischev foi considerada insultosa, humilhante e sem espaço no esporte.

    Sem dúvida, algo está mudando, aparentemente para melhor, pois, até pouco tempo atrás, assuntos e atos relacionados aos temas acima eram jogados para baixo do tapete.

    edgard alves

    Jornalista esportivo desde 1971, escreve sobre temas olímpicos. Participou da cobertura de seis Olimpíadas e quatro Pan-Americanos. Escreve às terças.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024