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    Edgard Alves

    Olimpíada entra em cena

    DE SÃO PAULO

    28/10/2014 02h00

    A Olímpiada-2016 no Rio caiu no esquecimento durante a campanha eleitoral encerrada no último domingo. Em nenhum momento ocorreu debate sobre o tema.

    Fora das eleições, os preparativos olímpicos também passaram sem qualquer arranhão. Será que os Jogos, cuja estimativa de custos já atinge cerca de R$ 38 bilhões, e possivelmente vai subir, deveria mesmo ser relegado ao esquecimento?

    Quem mais tinha obrigação de tocar nesse assunto era a oposição, que se calou. Ganharia pontos, nada perderia. Evitou criticar os gastos com o evento, assumido pelo Rio em 2009, em pleno governo Lula (PT), que se engajou sem freios na luta pelos direitos de promover os Jogos no Brasil.

    É provável que a oposição, liderada por Aécio Neves (PSDB), tenha optado pela preservação do seu telhado de vidro no caso, pois uma vitória no pleito levaria as pedras para as mãos do grupo rival.

    A Olimpíada, como foi a Copa, é catapulta de promoção para o governante de plantão, apesar da certeza de vaias nas cerimônias de abertura e encerramento. Mas é ele, o governo, que paga a conta, com o dinheiro do contribuinte. E os gastos pesados devem esvaziar os cofres a partir do ano que vem, pela necessidade de conclusão das obras, que têm prazos de finalização.

    Neste segundo semestre, as demandas olímpicas, estrategicamente, estavam sob controle, com obras tocadas pela liberação de verbas do COI (cerca de US$ 1,5 bi), relacionadas a incentivo da entidade e à venda de direitos de imagem de TV dos Jogos do Rio.

    Como visto, além da colaboração dos candidatos –Aécio e Dilma–, que se desviaram do tema Olimpíada na campanha, o COI e o Comitê Rio 2016, responsável pelos preparativos e organização dos Jogos, atuaram em harmonia no período eleitoral.

    Além da liberação de verbas, o presidente do COI, o alemão Thomas Bach, chegou a declarar que a eleição não era motivo de preocupação para a sua entidade. Os preparativos do Rio seguiam seu curso.

    Por sua vez, o presidente do Comitê Rio, Carlos Arthur Nuzman, não teve demandas no período. Não era mesmo para ter, uma vez que passou grande parte do tempo no exterior. Discutia o evento do Brasil lá fora, nos bastidores, evitando chances de encontros indesejáveis por aqui.

    O prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), outro envolvido diretamente com os Jogos, não teve pruridos. Em inspeção de comissão do COI no Rio, ele foi ao encontro dos visitantes e sapecou: Dilma e Pezão (candidato à reeleição estadual) vão ao segundo turno e sairão vitoriosos.

    Só ele garantia isso com tanta antecedência. A dupla ganhou, mas raspando. Ambos estão integrados com o projeto olímpico. Assim, pela ótica governamental, tudo continua como antes das eleições, exceto o Ministério do Esporte. Isto porque o ministro Aldo Rebelo (PCdoB) declarou que estava de saída da pasta, que entregaria o cargo ao final da atual gestão Dilma.

    Será que essa decisão de Rebelo continua valendo? No discurso da vitória, o nome de Rebelo foi lembrado por Dilma entre os citados nos agradecimentos pelo empenho na campanha.

    O programa de governo da presidente Dilma reconhece que durante a Olimpíada os olhos do mundo estarão voltados para o Brasil. Até aí, nada de novo. O fundamental é preparar o Rio adequadamente para acolher o evento, reivindicado e assumido publicamente.

    Medalhas? O governo quer o Brasil entre os dez mais bem colocados do mundo? Pura bobagem. Formar um atleta de alto rendimento é coisa para muitos anos.

    Restando pouco mais de um ano e meio para os Jogos, gastar na esperança de um milagre é engodo, jogar dinheiro no lixo. Resta propiciar condições ideais de treinamento para os que aí estão e ver no que dá.

    O governo deve se preocupar com esporte na formação dos jovens, na saúde, na escola, no social. Competir é para profissionais, outra freguesia.

    Numa manifestação de grevistas no canteiro de obras do Parque Olímpico, no Rio, pouco antes da Copa, teve até tiros disparados por um segurança. Os operários reivindicavam aumento salarial, plano de saúde extensivo à família, hora extra de 100%, valor de tíquete de alimentação e programa de produtividade, entre outros pontos.

    Faltava dinheiro, alegavam as empreiteiras, mas ainda havia pequena margem de tempo que dava para desperdiçar. Agora, não. Todo minuto deve ser aproveitado.

    A Olimpíada passa a ser um grande desafio para os governos, os mesmos que vacilaram naqueles momentos de greve. O Brasil vestiu a casaca de pai da noiva e vai ter de pagar a festa. Se a verba ficar curta demais, que a festa seja reduzida, sem perder a dignidade.

    edgard alves

    Jornalista esportivo desde 1971, escreve sobre temas olímpicos. Participou da cobertura de seis Olimpíadas e quatro Pan-Americanos. Escreve às terças.

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