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    Edgard Alves

    A longínqua prova de fogo da Olimpíada

    21/04/2015 02h00

    A organização dos Jogos Olímpicos do Rio enfrenta uma prova de fogo nestes dias, bem distante do Brasil, na longínqua Rússia, precisamente em Sochi, onde se deu a Olimpíada de Inverno, no começo do ano passado. Lá estão reunidas as federações internacionais das 28 modalidades do programa dos Jogos do ano que vem no Brasil.

    A importância desse encontro da Asoif (Associação Internacional das Federações das Olimpíadas de Verão) ficou clara na edição do ano passado, em Belek, na Turquia, quando os preparativos do Rio para os Jogos de 2016 sofreram seu maior revés. A cartolagem internacional, acirrada e agressiva, lançou farpas abertamente contra o trabalho e o andamento das obras no Brasil.

    A campanha anti-Rio colou fácil naquela oportunidade, e teve repercussão, porque havia obras em atraso –algumas nem sequer tinham saído do papel– e desacertos diversos, embora solucionáveis. Pegou o Brasil de surpresa.

    Vale ressaltar ainda que não faltaram críticas pela inexistência de um plano B caso houvesse risco de que as instalações não ficassem prontas a tempo. Um exagero, pois o panorama não era caótico que justificasse esse procedimento. Enfim, o projeto da Olimpíada e seus responsáveis ficaram marcados, como se faz com gado, por um ponto de interrogação.

    Os cartolas brasileiros envolvidos nos preparativos espernearam, tentaram defender posições, mas em momento algum tiveram sucesso. Eles não estavam lá. A pressão os apanhou de surpresa. Criticas pipocaram na mídia internacional.

    Enquanto isso, por aqui, a preocupação maior naquele momento era superar os atrasos e improvisações com os ajustes finais para a Copa do Mundo de futebol. Talvez por causa disso, a paulada olímpica ficou um pouco abafada no país.

    O Comitê Olímpico Internacional, pressionado pelas federações esportivas, acabou nomeando uma espécie de interventor, elaborou um plano de acompanhamento mais eficaz das obras esportivas e de infraestrutura, e se dispôs a enviar profissionais de sua base para monitoramento.

    A pressão foi reduzida com a vinda ao Brasil do presidente do COI, o alemão Thomas Bach, que se encontrou, e trocou informações, com a presidente Dilma. Os ponteiros foram ajustados após a onda da Copa. Uma reviravolta. Bach repetiu a visita. Criou-se uma sensação, não falsa completamente, mas enganosa, de que as coisas tinham entrado completamente nos eixos.

    A cada dia surgem dúvidas se algo segue dentro ou fora dos trilhos. Basta o caso da APO (Autoridade Pública Olímpica), que voltou a ficar acéfala. Está sem presidente há cerca de dois meses, desde que o general Fernando Azevedo e Silva pediu demissão, e a inépcia do Planalto não resolve a questão.

    O órgão é o responsável pela fiscalização e harmonia entre a União, o Comitê Rio 2016, e os governos do Rio, estadual e municipal, todos com responsabilidades na organização dos Jogos. A APO é um instrumento importante, elabora o orçamento, monitora os gastos públicos.

    Ainda pior. Tem projeto do plano básico da Olimpíada que já naufragou, como a proposta de limpeza da Baía de Guanabara.

    Perdeu-se grande parte do tempo que seria necessário para atingir a meta de despoluir 80% do esgoto despejado nas águas da Baía. Essa intervenção, além de proporcionar condições adequadas para os atletas, seria benéfica para a população e um dos maiores legados dos Jogos.

    Não bastasse a caótica situação da Baía de Guanabara, escolhida para as competições de vela, outro palco aquático da Olimpíada mostra efeitos de forte poluição: a Lagoa Rodrigo de Freitas, que receberá competições de remo e canoagem.

    Na semana passada, ali ocorreu mortandade de peixes em consequência de excesso de poluição ou queda na temperatura da água que afeta a biodiversidade do local. Sem as providências essenciais, a dizimação dos peixes persistirá, o que agravará a poluição na lagoa.

    Esse fato teve repercussão no exterior. Carlos Arthur Nuzman, presidente do comitê organizador e do Comitê Olímpico Brasileiro, tentou minimizar a inconveniente situação, declarando que até a abertura dos Jogos os problemas serão superados.
    As versões otimistas, no entanto, se chocam com outros duros golpes, como o recente relatório do TCU (Tribunal de Contas da União) apontando atrasos em obras no Parque Olímpico da Barra da Tijuca e no complexo esportivo de Deodoro, os dois principais núcleos da Olimpíada. Aos olhos do tribunal, falta de planejamento detalhado de forma adequada e descumprimento de metas fixadas em contratos seriam as causas do atraso.

    Com todo esse telhado de vidro, o comitê organizador tratou de se articular melhor para o encontro de Sochi. Em vez de repetir o processo de Belek, quando sua representação estava restrita praticamente ao diretor Agberto Guimarães, agora até o presidente Carlos Arthur Nuzman arrumou suas malas e embarcou para a Rússia. A lição da Turquia, marcante, virou senha para não se deixar pegar desprevenido novamente.

    edgard alves

    Jornalista esportivo desde 1971, escreve sobre temas olímpicos. Participou da cobertura de seis Olimpíadas e quatro Pan-Americanos. Escreve às terças.

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