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    Edgard Alves

    Após os Jogos do Rio, castelo de areia do esporte olímpico desaba

    04/04/2017 02h00

    Fabrice Coffrini/AFP
    The president of the Olympic Committee of Brazil and Rio 2016 Organising Committee for the Olympic Games, Carlos Arthur Nuzman delivers a speech during the closing ceremony of the Rio 2016 Olympic Games at the Maracana stadium in Rio de Janeiro on August 21, 2016. / AFP PHOTO / Fabrice COFFRINI
    O presidente do COB e do Comitê Rio-2016, Carlos Arthur Nuzman, no encerramento dos Jogos

    O Brasil foi palco da Olimpíada-2016, que envolveu gastos estimados em cerca de R$ 40 bilhões. O balanço ainda não foi fechado. Embora realizado com sucesso, o fim do evento desgraçadamente coincidiu com a economia nacional enfrentando uma das piores crises de sua história. O esforço valeu a pena para o esporte nacional?

    A julgar pelas declarações na semana passada do presidente do COB (Comitê Olímpico do Brasil), Carlos Arthur Nuzman, parece que não. Sem qualquer constrangimento, Nuzman em entrevista coletiva afirmou que " a partir de agora, a gente volta ao que era antes de Sydney-2000".

    Então, o esporte brasileiro está de volta à década de 90? Declaração macabra, mas inquietante se levadas em conta as duas décadas do próprio Nuzman na liderança do COB.

    Além disso, ele acumulou o comando do Comitê Rio, responsável pela organização da Olimpíada, e recentemente se lançou candidato à presidência da Odepa (Organização Desportiva Pan-Americana).

    Quando assumiu a presidência do COB, em junho de 1995, ele já tinha um discurso ambíguo sobre continuísmo nas gestões esportivas. Era contra, embora seu currículo registrasse 20 anos na chefia da CBV, a gestora do vôlei nacional. O sucesso alcançado pela modalidade, no entanto, amenizava a contradição.

    Nada impedia à época declarações sugerindo que o esporte brasileiro estava apenas decolando para o patamar de potência olímpica.

    Um ano depois de Nuzman assumir o poder no COB, o Brasil foi a Atlanta e, pela primeira vez, ultrapassou a marca de dez medalhas. Ganhou 15, três de ouro, também um registro inédito.

    Arrebatou ainda seus primeiros pódios olímpicos no feminino, com destaque para o ouro de Jacqueline Silva e Sandra Pires e a prata de Mônica Rodrigues e Adriana Samuel, no vôlei de praia, que estreava na Olimpíada. As mulheres ficaram também com a prata no basquete e o bronze no vôlei de quadra.

    Nuzman, espontaneamente, reconheceu que aquela campanha praticamente nada tinha a ver com sua gestão, pois assumira o posto quando a preparação da delegação estava encaminhada.

    Ocorre que, de lá para cá, a evolução foi modesta. O ápice, como era de se esperar, aconteceu em casa, no Rio. Chegou a 19 medalhas, sete delas de ouro, mas sem atingir a meta de colocar a delegação entre as dez mais laureadas dos Jogos, como vislumbrava o COB.

    Terminou em 12º lugar pelo total de medalhas. Em contrapartida, os brasileiros foram ao pódio em 12 esportes, um patamar superior ao das Olimpíadas anteriores.

    Após o encerramento dos Jogos, aos poucos as incertezas começaram a despontar. Com o galope da crise econômica, minguaram os patrocínios, antes abundantes pela exposição na vitrine da Olimpíada. Sólida, restou a Lei Piva, sancionada em julho de 2001 e que destina 2% das loterias federais ao COB e ao Comitê Paraolímpico.

    No último dia dos Jogos no Rio, Nuzman chegou a rebater questionamento sobre a sua permanência no comando do COB –logo depois foi eleito para a sexta gestão consecutiva–, insinuando que a larga experiência tinha tido reflexo na organização da exitosa Olimpíada.

    Naquele momento, o argumento soava tortuoso e complicado para ser rebatido. A declaração de que o esporte brasileiro volta no tempo, passados apenas sete meses, recoloca um ponto de interrogação nas chances de bons frutos na longevidade em cargos diretivos do esporte.

    Está evidente a dependência do setor por verbas públicas cada vez mais generosas e a ausência de uma estrutura sólida para caminhar com as próprias pernas.

    A sensação é semelhante à da construção de castelo de areia na praia, que fica à mercê da maré ou de uma óbvia onda mais alongada. Tudo vira simplesmente praia, em segundos.

    edgard alves

    Jornalista esportivo desde 1971, escreve sobre temas olímpicos. Participou da cobertura de seis Olimpíadas e quatro Pan-Americanos. Escreve às terças.

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