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    Eduardo Giannetti

    Regressão

    03/10/2014 02h00

    Depois de amanhã o Brasil vai às urnas. Seremos cerca de 142 milhões de eleitores escolhendo entre 25.549 candidatos (exclusive vices e suplentes) disputando 1.709 cargos públicos. É a sétima eleição geral sob a égide da Carta de 1988. Teria tudo para ser uma grande e bela festa democrática, não fosse a animosidade sórdida e sectária que tomou conta da campanha.

    Dois problemas institucionais prejudicam o processo eleitoral. A simultaneidade das eleições para o Executivo e o Legislativo condena a escolha de nossos parlamentares ao absoluto descaso. As campanhas a deputado ficam ofuscadas pelas disputas majoritárias que sugam todas as atenções. Escolha displicente, amnésia instantânea. Não é à toa que a qualidade dos legislativos é o que é.

    Some-se a isso a babel entrópica do horário gratuito. Fora a distribuição altamente desigual de tempo, a arquitetura do programa eleitoral é desnecessariamente grotesca.

    Em vez de se conceder a cada partido um segmento bem demarcado, preferencialmente em dias distintos, para que possam se dirigir ao eleitorado e apresentar, um por vez, suas propostas, o que se fez foi colocá-los espremidos, lado a lado, apelando por migalhas da nossa atenção.

    O resultado é um mosaico dantesco de mensagens disparatadas: uma mistura bizarra de leilão de promessas com flashes de uma rinha eletrônica de rompantes e acusações cruzadas. E tudo temperado, é claro, por doses cavalares de emoção sincera para ficarem todos bem ligados. Se alguém tramasse desmoralizar a nossa democracia, seria difícil imaginar fórmula mais eficaz.

    Mas nada disso permitiria prever a regressão da campanha em curso. Premida pela súbita ascensão de Marina e pelas revelações do Petrolão, a candidata-biônica à reeleição inventada por Lula e teleguiada por João Santana apelou de forma vil. Serviu-se do seu largo tempo de propaganda –fruto de alianças espúrias– e da feroz máquina governista para deflagrar uma despudorada ofensiva.

    O marketing selvagem de Dilma x Marina, calcado na exploração da credulidade, na mentira calculada e na excitação do medo, repete a fórmula empregada com sucesso por Collor x Lula. Se é verdade, como observa Marx, que certos fatos históricos tendem a ocorrer duas vezes, primeiro como tragédia e depois como farsa, a única dificuldade aqui é saber se neste caso a ordem não deveria ser invertida.

    Economia, educação, meio ambiente: o governo Dilma entrega um país pior do que recebeu. É a primeira vez que isso acontece desde o fim da ditadura. A animosidade sectária e a rendição ao marketing infame são a continuação do atual governo por outros meios. Indícios do que seria um segundo mandato.

    Eduardo Giannetti

    Escreveu até dezembro de 2014

    É formado em economia e em ciências sociais pela USP e PhD em Economia pela Universidade de Cambridge. É autor de artigos e livros, entre eles "Vícios privados, benefícios públicos?"

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