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    Elio Gaspari

    Saem Aécio e Dilma, volta Paulinho

    26/10/2014 02h00

    Hoje à noite será conhecido o nome do próximo presidente e a partir de amanhã as petrorroubalheiras voltarão a ter o destaque que merecem. Trata-se do maior e melhor documentado escândalo da história. Diante dele, o mensalão é coisa de flanelinhas. Pela primeira vez, o Ministério Público e o Judiciário terão a oportunidade para desvendar, expor e punir uma rede que envolve burocratas, operadores, políticos e grandes empresas. A colaboração de Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef com as autoridades já gerou um lote de inquéritos que se desdobrarão em diligências e prisões. No vértice dessa pirâmide estará o relator do processo no Supremo Tribunal Federal, ministro Teori Zavascki. Faltou sorte aos envolvidos, pois se trata de um magistrado silencioso, rápido e eficiente como a lâmina de uma guilhotina.

    Até agora, pelos vazamentos desordenados, as investigações estão poluídas por acusações que produzem mais calor do que energia. Por exemplo: o "amigo Paulinho" disse que em 2009 repassou R$ 10 milhões ao presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, para que ele ajudasse a travar uma CPI destinada a investigar a Petrobras. O capilé teria sido pago pela empreiteira Queiroz Galvão, uma das donatárias da obra da refinaria Abreu e Lima, aquela que deveria ter custado US$ 2,5 bilhões, já custou US$ 20 bilhões e ainda não está pronta. Prova, até agora, nenhuma. Paulinho contou também que em 2010 derramou R$ 1 milhão na campanha da petista Gleisi Hoffmann para o Senado. Essa acusação ampara-se numa anotação existente em sua agenda: "PB 0,1". Seriam as iniciais de Paulo Bernardo, ministro das Comunicações, marido de Gleisi e alto comissário do PT paranaense. Esse dinheiro teria sido entregue, em espécie, a um intermediário. O Ministério Público e o Judiciário sabem que, com esses elementos, as duas acusações valem rigorosamente nada. Se a Queiroz Galvão pagou a Guerra, será preciso rastrear o ervanário. O mesmo sucede no caso da senadora. Ou aparece a grana, ou "PB" tanto pode ser Paulo Bernardo como Papa Bergoglio e "0,1" pode significar um milhão ou uma esmola de dez centavos.

    O "amigo Paulinho" e Youssef merecem fé porque, pelos seus acordos com a Viúva, ficarão anos na cadeia se forem apanhados mentindo. O que vazou não é tudo o que eles contaram, e o Ministério Público e a Polícia Federal deverão aprofundar as investigações, documentando-as. Só esse trabalho poderá converter em acusação aquilo que, por enquanto, é um "ele me disse".

    A exposição das petrorroubalheiras criou uma situação paradoxal. Ao mesmo tempo em que se fala numa negociação das grandes empreiteiras para conseguirem um acordo de leniência com a Viúva, tanto a Odebrecht como a Camargo Corrêa negaram que tenham se metido em qualquer ato ilícito. No máximo, teriam sido extorquidas. Como? O procurador-geral Rodrigo Janot matou essa charada chamando a proposta de "cartel da leniência". O "amigo Paulinho" deu à Justiça os nomes dos representantes da Odebrecht, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, OAS e Queiroz Galvão com quem traficava. Só as investigações poderão mostrar do que tratavam e por quanto tratavam.

    *

    DECLARAÇÃO DE VOTO

    De uma víbora, ontem:

    "Depois que o TSE anunciar o resultado, direi a todo mundo que votei no perdedor. Assim, ninguém vai me cobrar pelo que acontecer nos próximos quatro anos."

    REAGAN E A DERROTA

    Hoje à noite, Dilma Rousseff ou Aécio Neves, bem como 14 candidatos que disputaram governos estaduais no segundo turno, sentirão o gosto amargo da derrota e nos seus arrabaldes começarão as acusações para justificar o resultado.

    Será perda de tempo. Aos derrotados, um exemplo de senso de humor diante do infortúnio:

    Quando o ex-presidente americano Ronald Reagan foi informado de que estava com o mal de Alzheimer, comentou:

    "Ótimo, vou conhecer gente nova todos os dias."

    A PROVA DO VETO

    Os dois candidatos a presidente disseram, durante a campanha, que teriam tolerância zero com ladroeiras. No escurinho do cinema, a Câmara aprovou um projeto que estende por 15 anos o prazo para a devolução do dinheiro da Viúva malversado por administradores públicos. Em todos os casos, eles já foram condenados pela Justiça. Coisa de R$ 1,7 bilhão.

    O projeto ainda deverá passar pelo Senado, mas, se o vencedor da eleição anunciar que vetará o mimo, mostrará que falava sério.

    Se vier a sancioná-lo, será chamado de mentiroso.

    JOAQUIM BARBOSA

    Muita gente boa no tucanato acreditou que Joaquim Barbosa pudesse vir a ser um relevante apoio para Aécio Neves. Ele votará em Buenos Aires, onde está, calado.

    Volta em novembro e, no início de 2015, segue para uma temporada numa universidade americana.

    *

    OS SEGREDOS DE BEN BRADLEE

    Aos 93 anos, morreu Ben Bradlee, o grande editor-executivo do "Washington Post" em seu período de glória. Comandou o jornal durante a investigação do caso Watergate, que resultou na renúncia do presidente Richard Nixon, em 1974. Bradlee saiu do samba de Cartola: levou a vida a sorrir, pois chorando teria a mocidade perdida. Tinha muitas rugas no rosto, todas rugas do sorriso. Nascido numa família da aristocracia de Boston, passou pela Marinha e daí resultou um personagem que misturava sofisticação com palavrões, encantava jantares e apagava cigarros nas xícaras de café. Nenhum outro diretor de jornal conseguiu tanto sucesso, dividindo-o para baixo e para cima. Bancou e orientou as reportagens dos dois garotos (Carl Bernstein e Bob Woodward) que transformaram uma notinha de plantão no caso Watergate. Ao mesmo tempo, ajudou a transformar Katharine Graham, a dona do jornal, uma dondoca tímida maltratada por um marido maluco, numa leoa, exemplo para a espécie pelo mundo afora.

    Bradlee tinha consigo dois segredos. Dum, livrou-se em vida. Contou que nunca acreditou integralmente na história de Woodward segundo a qual marcava encontros com um informante botando jarros de flores e uma bandeira americana na varanda de seu apartamento. A cena estava mais para enfeite.

    O segundo segredo, levou consigo. Ele era cunhado de Mary Pinchot, uma mulher linda, a mais inteligente entre todas as amantes do presidente John Kennedy. Ela havia sido casada com um bamba da CIA. Kennedy tomou um tiro na cabeça em 1963 e ela na nuca, em 1964, aos 42 anos. No dia em que Mary foi morta na rua, Bradlee foi à sua casa e lá encontrou o segundo homem da CIA, James Angleton, também conhecido como "o serralheiro". Angleton procurava a diário da senhora. Achou-o e levou-o. Quando o devolveu a Bradlee, ele leu-o e queimou-o. Nunca contou o que havia nele.

    elio gaspari

    Nascido na Itália, veio ainda criança para o Brasil, onde fez sua carreira jornalística. Recebeu o prêmio de melhor ensaio da ABL em 2003 por 'As Ilusões Armadas'. Escreve às quartas-feiras e domingos.

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