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    Elio Gaspari

    Duas mulheres de 1917

    12/03/2017 02h00

    Com o transcurso da Semana Internacional da Mulher, no ano do centenário da Revolução Russa de março e do golpe bolchevique de outubro, aqui vão breves lembranças da vida de duas mulheres que tiveram a vida mudada naqueles dias.

    Com pernas de zagueiro e uma incrível capacidade de sedução, a bailarina Matilda Kchessinskaia tinha 20 anos quanto o futuro czar Nicolau deixou a virgindade na sua cama. O rapaz tinha 24 anos. Ela tornou-se amante de dois grão-duques, teve filho com um deles, mas nunca disse de qual.

    Acumulou uma fortuna e vivia num palacete em São Petersburgo até que sua casa foi ocupada (e saqueada) pelos bolcheviques. Lênin foi para lá quando chegou à Rússia. A bailarina viu uma estrela do feminismo comunista desfilando no jardim com seu casaco de arminho.

    Kchessinskaia fugiu com suas joias e acabou em Paris, onde montou uma escola de dança. Como aconteceu a quase toda a plutocracia russa, viveu no exílio vendendo joias e esperando o colapso do comunismo. Morreu em 1971, aos 99 anos, na pobreza, ajudada por uns poucos amigos, entre eles a bailarina Margot Fonteyn.

    Matilda estava no lugar certo da escala social, porém ficou do lado errado da revolução. Lidia Pereprigina era uma órfã de 15 anos, de uma pobre família da Sibéria. Estava no lugar errado da escala social mas namorara Iossif, ou Koba, um bolchevique banido que passava semanas sozinho no no gelo do Ártico, acompanhado apenas pelo cão. Em 1917 Lidia estava grávida do comunista. Ele tinha 39 anos e boa pinta. Deixou o vilarejo em março e nunca mais deu notícias, nem para saber se a criança tinha nascido. Só em 1921 Lidia associou Koba ao Stálin que aparecia nos jornais, mas nunca tentou contatá-lo. Mais tarde, contou a verdade ao menino Alexander, advertindo de que ele não devia revelá-la a ninguém.

    O filho de Stálin lutou na guerra, foi ferido três vezes, viu-se promovido a major e cuidou de uma cantina numa cidade de mineiros. Lidia morreu em silêncio, mas seu neto, Iuri Davidov, fez um exame de DNA com amostras de outro descendente de Stálin e encerrou décadas de rumores.

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    elio gaspari

    Nascido na Itália, veio ainda criança para o Brasil, onde fez sua carreira jornalística. Recebeu o prêmio de melhor ensaio da ABL em 2003 por 'As Ilusões Armadas'. Escreve às quartas-feiras e domingos.

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