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    Érica Fraga

    Dizer para a criança que ela pode aprender tem impacto enorme

    13/09/2017 02h00

    Vidal Tarqui - 20.ago.17/Xinhua
    (170820) -- LIMA, agosto 20, 2017 (Xinhua) -- Niños participan en un evento en el marco del Día Internacional del Niño, en el Parque Kennedy, en el distrito de Miraflores, en Lima, Perú, el 20 de agosto de 2017. (Xinhu/Vidal Tarqui/ANDINA) (rtg) (ah)
    Crianças em evento em Lima; governo peruano testa programa para melhorar qualidade da educação

    Você pode treinar seu cérebro e se tornar mais inteligente.

    Essa é a mensagem de um programa educacional simples e barato, chamado "Expande tu mente", que o governo Peru tem testado em suas escolas com impacto relevante na aprendizagem de alguns alunos.

    O projeto se baseia em pesquisas feitas nas últimas décadas por especialistas como Carol Dweck e Lisa S. Blackwell que mostram que a inteligência não é um ativo fixo e inalterável.

    Quem acredita que pode desenvolver mais habilidades tem maiores chances de atingir seus objetivos, segundo esses estudos.

    Partindo dessa premissa, o programa —que tem apoio do Banco Mundial, da Universidade de Oxford e do grupo peruano de pesquisa Grade— consiste em uma única sessão na qual os alunos de ensino médio recebem um artigo curto chamado "Sabias que puedes hacer crecer tu inteligencia?"

    O texto explica, de forma amigável e com ilustrações, como a nossa capacidade cognitiva é maleável, como o cérebro funciona e como as conexões entre suas células nervosas crescem e se fortalecem à medida que aprendemos coisas novas.

    Em seguida, a classe discute o artigo com o professor encarregado pela monitoria. Um cartaz para que os alunos se lembrem constantemente do que leram é pendurado na sala de aula.

    E, no fim, cada estudante escreve uma carta contando para um familiar ou amigo o que aprendeu sobre o assunto e dando conselhos.

    Segundo o Banco Mundial, o programa-piloto —que começou a ser testado em 2015— gerou um impacto positivo nas notas dos alunos, que, em média, equivaleria ao que seria conseguido por um aumento de dois a três anos na escolaridade de seus pais.

    Esse tipo de comparação costuma ser usada porque há farta evidência de que o número de anos de estudo dos pais tem forte relação causal com o desempenho acadêmico dos filhos.

    Embora o aumento da escolaridade da população adulta seja desejável, por inúmeros motivos, trata-se de um processo demorado. Não daria para contar só com isso como estratégia para melhorar a aprendizagem das crianças no curto prazo.

    O que o governo do Peru está tentando fazer é justamente identificar soluções efetivas, escaláveis, com uma boa relação entre custo e benefício, que ajudem o país a melhorar a qualidade da educação em um horizonte mais próximo de tempo.

    Criou para isso uma espécie de laboratório de inovações educacionais (MineduLAB) que se associa a pesquisadores da área para implementar, testar e mensurar novas iniciativas.

    Foi nesse contexto que o "Expande tu mente" foi implantado em um grupo grande de escolas de três regiões do país e seus resultados, aferidos em um teste de aprendizagem nacional comparados posteriormente com os de outras instituições que não receberam a intervenção.

    Segundo um relatório divulgado há duas semanas pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), as poucas iniciativas em países em desenvolvimento que buscam motivar os alunos e tiveram sua efetividade mensurada apresentaram efeito positivo sobre a aprendizagem.

    Esse tipo de programa tem a vantagem de ser relativamente barato.

    O estudo da instituição, cujo foco são as políticas públicas para o desenvolvimento de habilidades, ressalta que o "Expande tu mente" teve um custo de apenas US$ 0,1 por cada ponto a mais de aprendizagem dos alunos em testes padronizados. Iniciativas mais populares como reduzir o tamanho da classe e expandir a jornada escolar, diz o BID, custam, respectivamente, US$ 47 e US$ 210 por cada ponto a mais de aprendizagem gerado.

    Num website que acabou de lançar, o BID fornece um resumo da evidência internacional da efetividade de diversas políticas educacionais, com foco em distintos objetivos e faixas etárias.

    A mensagem da instituição multilateral para os formuladores de políticas públicas é clara, direta: não adianta aumentar os recursos investidos em educação sem mensurar, de forma bem-feita, com critérios e metodologia apropriados, os resultados de suas iniciativas.

    É preciso saber se os tiros que damos têm atingido seu alvo e a que custo.

    A julgar pelos resultados ainda decepcionantes da região em testes internacionais de aprendizagem, a despeito do aumento dos nossos gastos em educação nos últimos anos, essa mensagem ainda não parece ter sido bem apreendida. Mas iniciativas como a do governo peruano são um alento.

    No mais, para quem lida com crianças, os resultados preliminares do "Expande tu mente" indicam que vale muito a pena explicar para elas, de forma simples, que elas conseguem aprender, podem melhorar, são capazes de desenvolver talentos se treinarem para isso.

    É uma atitude simples que, na correria do dia a dia, dificilmente entra no nosso radar.

    érica fraga

    É jornalista com mestrado em Economia Política Internacional no Reino Unido. Venceu os prêmios Esso, CNI e Citigroup. Mãe de três meninos, escreve sobre educação, às quartas.

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