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    Érica Fraga

    Rede social torna brasileiro menos ruim em trabalho de grupo

    20/12/2017 02h00

    Damien Meyer/AFP
    This photograph taken on September 28, 2017, shows a smartphone being operated in front of GAFA logos (acronym for Google, Apple, Facebook and Amazon web giants) as background in Hédé-Bazouges, western France. / AFP PHOTO / Damien MEYER
    Projeção da tela de exibição de um smartphone

    A busca por profissionais que trabalhem bem em grupo só aumenta. Muitas empresas já listam essa habilidade entre os requisitos de emprego em anúncios de vagas.

    Uma pesquisa minuciosa do economista David Deming, de Harvard, mostra que as profissões em alta nos Estados Unidos são aquelas que combinam alto raciocínio matemático com muita interação social.

    Em um mundo cada vez mais conectado por internet, redes sociais, digitalização e automação, isso parece uma tendência irreversível.

    Por isso, uma questão que começa a ser investigada é se os jovens têm saído da escola preparados para fazer diagnósticos, traçar planos e desenvolvê-los em conjunto com seus pares.

    Na mais recente edição do Pisa, exame internacional de aprendizagem, a OCDE tentou mensurar essa capacidade e apontar alguns caminhos para seu desenvolvimento.

    Os resultados divulgados há poucas semanas são desoladores para o Brasil. Entre 51 países (ou províncias), ficamos em penúltimo lugar, na frente apenas da Tunísia.

    Dois em cada dez adolescentes brasileiros estão abaixo do nível mínimo de proficiência em resolução colaborativa de problemas.

    Trata-se de um patamar tão baixo que a OCDE explica que sua análise não foi desenhada para avaliar as aptidões dos que se enquadraram na categoria.

    Mas, pela descrição dos degraus de proficiência mensurados, dá para inferir o que falta aos jovens brasileiros.

    Por exemplo, apenas 0,6% deles se encontra no nível 4, o mais sofisticado, onde estão os que conseguem "solucionar problemas complexos...mantendo informação de background relevante em mente", que se "mantêm cientes da dinâmica do grupo e agem para garantir que seus membros cumpram os papéis combinados".

    A pedagoga Sandra Garcia, coordenadora da Mind Lab —que desenvolve jogos para melhorar habilidades como capacidade de colaboração—, disse-me outro dia que não é incomum no Brasil que os jovens trabalhem em grupo sem adotar "uma perspectiva de equipe".

    "Eles pensam no 'eu e o grupo' sem considerar o 'eu como para com o grupo'", diz Sandra.

    Foi exatamente assim que a OCDE classificou 40% dos adolescentes brasileiros enquadrados no nível 1, em que prevalece a tendência em "focar o seu papel individual dentro dos grupos" e só possibilita a resolução de problemas pouco complexos.

    Um possível raciocínio é que a aprendizagem deficiente no Brasil, revelada a cada edição do próprio Pisa, pode comprometer a capacidade dos alunos de trabalhar em grupo. Que conhecimento, afinal, eles poderiam compartilhar e aprimorar?

    Isso é, parcialmente, verdade. As notas dos jovens de 15 anos em ciências, matemática e leitura —disciplinas avaliadas no Pisa— explicam menos de dois terços de seu desempenho na resolução colaborativa de problemas. O restante parece relacionado a outras questões.

    Videogames, como seria de esperar, minam a capacidade de interação social. Os alunos que jogaram na véspera do exame marcaram, em média, 32 pontos a menos que os demais em resolução de problemas em grupo. É bastante se considerarmos que Cingapura, o país com melhor desempenho, atingiu 561 pontos.

    Pais que conversam com os filhos sobre a vida escolar parecem contribuir para que eles se relacionem melhor com os demais, o que também soa previsível.

    Um achado interessante foi um aparente impacto positivo do acesso a redes sociais e à internet sobre a capacidade de resolução coletiva de problemas em alguns países.

    O mundo virtual não raro motiva preocupações sobre convívio artificial —e, consequentemente, limitante— entre as pessoas. A relação identificada pela OCDE pode indicar o contrário, pelo menos em alguns países.

    A correlação positiva entre o acesso às redes e a habilidade de resolver questões em grupo foi identificada em 23 deles. O Brasil é um dos três onde esse impacto foi especialmente forte, associado a um aumento de 35 pontos nas notas médias dos alunos.

    É um resultado que merece maior investigação. Se bem usadas, a internet e as redes sociais podem contribuir para melhorar a formação deficiente e atrasada do brasileiro.

    érica fraga

    É jornalista com mestrado em Economia Política Internacional no Reino Unido. Venceu os prêmios Esso, CNI e Citigroup. Mãe de três meninos, escreve sobre educação, às quartas.

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