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    Fábio Seixas

    Mundial da canetada

    14/03/2014 03h00

    Hegemonias têm uma beleza difícil de compreender.

    Sem exceção, são fruto de trabalho duro ou de um golpe de genialidade. Duas virtudes admiráveis.

    Criam, como subproduto, um enorme desafio. Legiões de concorrentes que tentam derrubá-las. Fazem gente boa sair da zona de conforto, coçar a cabeça, olhar para novos ângulos, inventar. Provocam revisões radicais de procedimentos. Elevam o patamar das competições, quaisquer que sejam.

    Mas há quem prefira rotulá-las de chatas, monótonas, repetitivas. E quando isso se reflete em perda de dinheiro, a solução é simples. Foge-se do caminho da inventividade, do desafio. Parte-se para a canetada.

    O que Red Bull fez nos últimos anos foi admirável.

    Em 2004, o empresário Dietrich Mateschitz comprou a Jaguar, um dos maiores fiascos da história da F-1 –que, por sua vez, em 2000 assumira o lugar da Stewart, time modesto, mas dos mais competentes.

    Pouco a pouco, passo a passo, o austríaco reestruturou a equipe. Não, dinheiro não faltava. Mas na F-1 o resultado do investimento não é imediato. Até porque a concorrência também é bem abastada.

    A Red Bull foi sétima colocada nos dois primeiros Mundiais que disputou, 2005 e 2006.

    No ano seguinte, ficou em quinto lugar. Em 2008, caiu novamente para sétimo. Em 2009, com a chegada de Vettel –sim, piloto faz diferença–, venceu suas primeiras corridas e foi vice-campeã.

    A partir de 2010, ganhou tudo.

    Não foi fruto do acaso. Como descrito ali no começo, teve muitíssimo trabalho e alguns lances geniais de Vettel e Newey.

    Mas a FIA resolveu encerrar tudo com uma canetada. Ou algumas.

    A F-1 que começa neste final de semana, na Austrália, é uma nova categoria. Novos motores, novos sistemas de reaproveitamento de energia, nova aerodinâmica, novos tanques de combustível.

    A chance de uma equipe se manter no topo é de 1 em 11 –o número de times no grid. Deu a lógica matemática. Ou o planejado. A Red Bull dançou, começa o ano com grandes chances de não chegar ao fim dos primeiros GPs.

    Por favor, não confundam as coisas.

    Vai ser ótimo ver um campeonato equilibrado, com vários vencedores, dinâmico, cheio de alternativas, com possibilidades de boas surpresas. Provavelmente fecharemos o Mundial aclamando um novo campeão. Ou festejando o bi de Hamilton ou Button ou Raikkonen. Ou aplaudindo o tri de Alonso.

    Mas este colunista, talvez um purista, preferiria que uma ou mais equipes tivessem superado a Red Bull na base da inventividade, no chão de fábrica. Que tivessem encontrado algo especial em seus boxes. Que um piloto de repente encaixasse um ano brilhante, inspirado na solidão de seu cockpit.

    Não. A revolução aconteceu dentro de escritórios. Uma pena.

    fábio seixas

    Escreveu até junho de 2016

    É jornalista com mestrado em Administração Esportiva pela London Metropolitan University, da Inglaterra.

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