• Colunistas

    Tuesday, 30-Apr-2024 12:11:44 -03
    [an error occurred while processing this directive]
    Fernando Canzian

    Brasil no buraco

    23/10/2014 02h00

    Pesquisa Datafolha de ontem (22/10) mostra que os brasileiros caminham despreocupadamente neste final do governo Dilma Rousseff. Há otimismo geral quanto ao emprego, poder de compra, situação do país e a pessoal. Passadas as eleições, o tombo pode ser maior entre os mais incautos.

    A melhor notícia do governo Dilma na área econômica é o emprego: taxa de 4,9%. Isso caracteriza, praticamente, situação de pleno emprego. Mas o custo por trás dessa taxa positiva não está visível; e terá de ser pago no médio e longo prazos.

    Os quadros abaixo tentam mostrar esses desafios. Eles comparam indicadores essenciais da economia. Como Dilma pegou o país a partir de janeiro de 2011 e como está terminando seu mandato.

    Editoria de Arte/Folhapress

    A taxa de desemprego é a melhor notícia (caiu de 6,7% em 2010 para 4,9% agora). Mas o que vem por baixo é extremamente preocupante, a começar pela situação das contas externas.

    Em 2014, o Brasil vai precisar de financiamento externo de mais US$ 80 bilhões (R$ 200 bilhões) para tapar o buraco em sua conta corrente com o resto do mundo. Esse déficit passou de 2,2% do PIB em 2010 para 3,8% agora. É o terceiro maior rombo do mundo.

    Isso ocorre em grande medida porque o país terá um superávit comercial (diferença entre exportações e importações) de pífios US$ 700 milhões neste ano, contra mais de US$ 20 bilhões em 2010.

    Menos dólares entrando via comércio exterior e mais necessidade de financiamento externo pressionam para cima a cotação do dólar. O que torna mais caras as importações que competem com bens produzidos no Brasil, dificultando o combate à inflação.

    Mario Kanno/Folhapress

    No quadro acima, o retrato do que vivemos hoje, apesar do pleno emprego. Inflação alta, juros elevados e crescimento do PIB perto de zero.

    Normalmente, quando um país cresce pouco, a tendência da inflação é ficar muito baixa, como ocorre hoje nos países avançados. No Brasil, temos essa estranha combinação de baixa atividade e preços furando o teto da meta de inflação do Banco Central a todo momento.

    Isso tem forçado o Banco Central a elevar os juros. E Dilma entregará neste ano uma taxa básica (a Selic) maior do que a que herdou do governo Lula, com impactos importantes no aumento da dívida pública brasileira.

    Mario Kanno/Folhapress

    Como mostra o quadro acima, além de ter aumentado os juros, Dilma diminuiu de forma acentuada a poupança que o governo faz para abater encargos sobre a dívida pública (o chamado superávit primário). Essa poupança, que equivalia a 2,8% do PIB em 2010, deve ficar em 1,3% neste ano. O resultado é que a dívida pública aumentou, minando a confiança de investidores em financiar mais esse rombo do governo.

    O ciclo pode se tornar muito nocivo, à medida que o mercado pode começar a pedir juros cada vez mais elevados para financiar a dívida pública, agravando o problema ao longo do tempo.

    O destaque no quadro para a chamada "taxa de investimento" é necessário porque aí está a razão de todos os grandes problemas atuais.

    O PIB é composto de vários itens, como consumo das famílias, agronegócio etc. A "taxa de investimento" é quanto os empresários tiram do bolso para ampliar ou abrir novos negócios. Ela é fundamental para fazer o país crescer sem inflação e com mais produtividade.

    Dilma e suas medidas erráticas na economia levaram a uma retração recorde na confiança dos empresários em investir durante o seu governo. A "taxa de investimentos" como proporção do PIB despencou, de quase 22% ao final da era Lula para 16,5% agora. O consenso é que essa taxa, no Brasil, deveria estar em 25% para o país crescer de forma sustentada e sem inflação.

    A raiz dos desarranjos atuais é, primordialmente, essa: desconfiança dos donos do dinheiro em relação ao governo. Seja quem for eleito no domingo, a prioridade é parar de cavar esse buraco.

    fernando canzian

    É repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de política, do "Painel" e correspondente da Folha em NY e Washington. Vencedor de quatro prêmios Esso.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024