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    Fernando Canzian

    Tragédia grega

    16/04/2015 17h12

    O que você faria se tivesse dinheiro no banco e corresse o risco, em questão de dias, de que ele virasse pó?

    Milhares de gregos estão neste momento acentuando uma corrida bancária que já dura meses na Grécia, temendo que o país dê um calote no sistema financeiro internacional e seja expulso, por bem ou por mal, da zona do euro.

    Se isso acontecer, o governo grego pode ser obrigado a substituir o euro por uma nova moeda (dracmas?), que não valeria quase nada após o caos de hiperinflação e fuga de capitais que se seguiria no país. Daí tirar euros do bancos antes que eles acabem no país.

    O arranjo monetário europeu tem 16 anos e o euro é usado por 19 dos 28 Estados-membros da União Europeia. Nunca um país esteve tão perto de uma ruptura quanto a Grécia agora.

    Os estragos para a Zona do Euro, após anos de agonia grega, seriam pequenos hoje. Há anos os bancos europeus vêm fazendo provisões em seus balanços para neutralizar um eventual calote da Grécia, que só respira com a ajuda de aparelhos.

    No total, o país obteve US$ 245 bilhões em ajuda do FMI e da União Europeia nos últimos cinco anos. Mesmo um calote neste valor não faria grande diferença na saúde de organismos financeiros de ajuda internacional.

    Neste momento, a Grécia está sem caixa para pagar US$ 2,4 bilhões em aposentadorias e salários de servidores, ainda atrasados neste mês de abril. E teria de desembolsar outros U$ 2,6 bilhões para o FMI até junho, sendo que a primeira parcela (de US$ 203 milhões) vence na virada do mês.

    O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, foi eleito em janeiro pela esquerda com a proposta radical de enfrentar a "ditadura monetária" imposta pela Comissão Europeia (com Alemanha à frente), Banco Central Europeu e FMI. A chamada "troika" exige um forte ajuste fiscal grego, com cortes radicais de salários, cargos públicos e benefícios de aposentadoria.

    Tsipras cometeria um "estelionato eleitoral" maior do que o de Dilma Rousseff no Brasil se levasse todo o ajuste exigido à frente. À falta de dinheiro, portanto, soma-se um forte ingrediente político para o possível calote.

    Por incrível que pareça, há quem hoje na União Europeia até espere um calote, tendo em vista os efeitos diminutos que ele traria para o sistema financeiro da região e o caos interno que causaria na própria Grécia.

    Diante da tragédia grega, governos como o da Espanha, pressionados por partidos de esquerda que pregam a ruptura com a "troika" (como o espanhol Podemos), teriam bons argumentos para seguir ajustando suas economias e se livrar de ameaças políticas mais radicais.

    fernando canzian

    É repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de política, do "Painel" e correspondente da Folha em NY e Washington. Vencedor de quatro prêmios Esso.

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